MARQUÊS DE POMBAL E A REFORMA EDUCACIONAL BRASILEIRA
Ana
Paula Seco
Tania
Conceição Iglesias do Amaral
RESUMO: A origem e o desenvolvimento
histórico da educação pública no
Brasil são estritamente ligados as ações
reformistas empreendida pelo Marquês de Pombal durante
o seu governo de Portugal e possessões no
período colonial, notadamente por meio do banimento do
trabalho missionário e catequético empreendidos
pela Companhia de Jesus. Após quase cinco séculos
de história, tal tema permanece ainda no horizonte acadêmico
como importante debate e referência de pesquisa. Este trabalho
apresenta a discussão sobre o contexto em que se deu a
primeira reforma educacional no país, e mais precisamente,
discute a relação
direta entre a expulsão dos jesuítas e a necessidade
da implantação de um novo modelo educacional no
Brasil. Tem como objetivo realçar importantes contingências
a serem consideradas na análise da gênese da educação
pública no país por meio do percurso da história.
Evidencia a reforma educacional do Marques de Pombal como uma
estratégia que se apresentou necessária, não
só pela lacuna deixada pelo sistema jesuítico de
ensino, mas também como tentativa de modernização da sociedade
em prol do desenvolvimento da economia portuguesa para manutenção
e fortalecimento do seu regime absolutista.
Palavras-chave: Marques
de Pombal, Reforma Educacional Pombalina, Ensino Estatal, Política
colonial.
A reforma Pombalina é um importante marco na Historiografia da Educação
Brasileira. Por ser contextual, não é possível
compreendê-la senão por meio da própria História
do Brasil enquanto Colônia de Portugal, espaço temporal
onde foi criada. Isso passa necessariamente pelo entendimento das
idéias de quem a gerou, qual seja, um dos vultos históricos
mais contundentes de Portugal e da América Portuguesa, Sebastião
José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal (primeiro
ministro de Portugal de 1750-1777). Tanto ele como o seu governo controverso
permanecem motivo de polêmica até
hoje. Para além do mito, ficou o debate que a sua atuação
suscitou ao longo de décadas: o lastro ideológico,
reformador e autoritário, voluntarista e despótico
e de tirano esclarecido. Deste modo, a análise das transformações
da sociedade portuguesa em meados do século XVIII, consubstanciadas
nas Reformas Pombalinas, que abarcaram os
âmbitos econômico, administrativo e educacional, tanto
em Portugal como nas suas colônias, requer o conhecimento
da situação da metrópole neste período.
A política colonial portuguesa tinha como objetivo
a conquista do capital necessário para sua passagem da etapa
mercantil para a industrial. Porém, Portugal não
conseguiu alcançar este objetivo. A nação
que se destacava neste período era a Inglaterra, bastante
beneficiada pelos lucros coloniais dos portugueses.
“Com
o Tratado de Methwen (1703), firmado com a Inglaterra, país
já inserido no capitalismo industrial, o processo de industrialização
em Portugal é sufocado. Seu mercado interno foi inundado
pelas manufaturas inglesas, enquanto a Inglaterra se comprometia
a comprar os vinhos fabricados
em Portugal. Canaliza-se
, assim, para a Inglaterra, o capital português, diante da
desvantagem dos preços dos produtos agrícolas em
relação aos manufaturados. Desta maneira, enquanto
uma metrópole entrava em decadência (Portugal) outra
estava em ascensão (Inglaterra)” (Ribeiro, 2000, p.
29)
Na análise de Leôncio Bausbaum (1957) sobre a
situação econômica e política dos países
colonizadores, fica claro a posição de Portugal frente às
demais potências da época, concluindo que a Inglaterra
a partir do século XVI e, principalmente, do século
XVII já era uma nação burguesa e industrial
estando à frente das demais.
“Como
nação, continuava Portugal um país pobre,
sem capitais, quase despovoado, com uma lavoura decadente pela
falta de braços que a trabalhassem, pelas relações
de caráter feudal ainda existentes, dirigido por um Rei
absoluto, uma nobreza arruinada, quase sem terras e sem fontes
de renda, onde se salientava uma burguesia mercantil rica mas politicamente
débil, preocupada apenas em importar e vender para o estrangeiro
especiarias e escravos e viver no luxo e na ostentação.” (Bausbaum,
1957, p. 48-9).
Neste período, o então rei de Portugal, D. José I,
nomeia para seu ministro Sebastião José de Carvalho
e Melo, o Marquês de Pombal, que caminha no sentido de recuperar
a economia através de uma concentração do
poder real e de modernizar a cultura portuguesa, reforçando
o Pacto Colonial, iniciando assim, uma tentativa de transformação
no século XVII com as Reformas Pombalinas.
Tais reformas visavam transformar Portugal numa metrópole
capitalista, seguindo o exemplo da Inglaterra, além de adaptar
sua maior colônia o Brasil a fim de acomodá-la a nova
ordem pretendida
em Portugal. A
idéia de pôr o reinado português em condições
econômicas tais que lhe permitissem competir com as nações
estrangeiras era talvez a mais forte razão das reformas
pombalinas.
Assim, Pombal procurou industrializar Portugal, decretando
altos impostos sobre os produtos importados. Fundou a Companhia
dos Vinhos do Douro, que monopolizou a comercialização
dos vinhos em Portugal, prejudicando a nobreza que produzia vinhos
em suas quintas. Incentivou a produção agrícola
e a construção naval. Reformou a instrução
pública e fundou várias academias. Confiou a reorganização
do Exército português ao conde de Schaumburg-Lippe,
militar alemão. Acabou com a distinção entre
cristãos-novos e cristãos-velhos. Entretanto, o exemplo
mais conhecido de suas ações reformadoras é a
expulsão dos jesuítas de Portugal e de seus domínios.
Em relação à colônia, Pombal
procurou organizar melhor a exploração das riquezas
do Brasil, pois, dessa forma, aumentariam os ganhos de Portugal,
tão necessários para alcançar os objetivos
pombalinos referentes à economia portuguesa. Criou duas
companhias de comércio, a do Grão-Pará e Maranhão
e a de Pernambuco e Paraíba, para financiarem a produção
de açúcar, café e algodão e depois
comercializarem os produtos. O algodão era exportado para
a Inglaterra e para as indústrias por ele criadas
em Portugal. Incentivou
a indústria de construção naval, com a criação
de estaleiros, a de laticínios, de anil e de cochonilha.
Com relação à mineração, aboliu o imposto
do quinto (pagamento ao rei da quinta parte de toda a produção
de ouro), substituindo-o pela avença (cobrança fixa
de 100 arrobas). Suprimiu o regime de contratos para a exploração
dos diamantes, criando a Real Extração. Para melhor
controlar a exportação do ouro e dos diamantes, mudou
a capital de Salvador para o Rio de Janeiro, que era o porto por
onde saíam os metais preciosos. Criou um tribunal da relação
na nova capital e juntas de justiça em todas as capitanias.
As capitanias hereditárias que ainda pertenciam a particulares
foram compradas pela Coroa durante seu governo e transformadas
em capitanias reais.
Em 1753, Pombal extinguiu a escravidão dos índios no Maranhão,
onde ela era mais comum que no resto da colônia. Em 1755,
proclamou a libertação dos indígenas em todo
o Brasil, indo ao mesmo tempo contra os proprietários de
escravos índios e os jesuítas, que dirigiam a vida
das comunidades indígenas nas missões (aldeamentos
indígenas organizados pelos jesuítas). Após
ter expulsado os jesuítas de Portugal, obrigou-os também
a sair do Brasil em 1760. Pombal proibiu a discriminação
aos índios e elaborou uma lei favorecendo o casamento entre
eles e portugueses. Finalmente, criou o Diretório dos Índios
para substituir os jesuítas na administração
das missões.
Segundo Maxwell, Pombal não agia por intenção,
mas pelas opções determinadas pela posição
de Portugal no sistema de Estado mercantilista do século
XVIII. No caso da expulsão dos jesuítas, o que pretendia
era a supressão do domínio dos religiosos sobre a
fronteira, acordada no tratado de Madri, onde estavam situadas as sete missões
jesuíticas. Seu objetivo era que os
índios fossem libertados da tutela religiosa e se miscigenassem
para assegurar um crescimento populacional que permitiria o controle
do interior, nas fronteiras. Na verdade, não acreditava
em uma emigração européia que pudesse cumprir
com essa tarefa, era mais fácil europeizar, digamos assim,
a população local. Para ele, o afastamento dos jesuítas
dessa região significava tão somente, assegurar o
futuro da América Portuguesa através do povoamento
estratégico. O interesse de Estado acabou entrando em choque
com a política protecionista dos jesuítas para com
os índios e melindrando as relações com Pombal,
tendo este fato entrado para a história como “uma
grande rivalidade entre as idéias iluministas de Pombal
e a educação de base religiosa jesuítica”.
É importante lembrar que embora o iluminismo estar presente na Europa
do século XVIII, Pombal não pode ser considerado
um defensor do mesmo, pelo menos não do iluminismo que pregava
a autonomia. Ao contrário, como estadista que era, considerava
as idéias iluministas dos demais países da Europa
perigosas à
autoridade real. Não obstante, sentia a necessidade de colocar
Portugal a altura das demais nações esclarecidas
da época, mas sobre o controle de um forte poder centralizador.
Esse esclarecimento sobre as ações do Marquês de Pombal,
por quem se introduziu o iluminismo no império português, é importante
para compreender que diferentemente da maior parte dos governantes
Iluministas, mais preocupados com a teoria do que com a prática,
Pombal geralmente atingiu seus objetivos. E não menos pela
reforma educacional, por meio da qual abriu as portas a um florescimento
da ciência e da filosofia portuguesas em fins do século
XVIII, mas pelas relações entre o Iluminismo e o
exercício do poder do Estado. Não foi por espírito
libertador e igualitário que Pombal empreendeu a reforma
educacional por meio de mestres e professores seculares, mas pela
necessidade, além de preencher o extenso vazio deixado pela
expulsão dos jesuítas, preparar homens suficientemente
capazes para assumir postos de comando no Estado absolutista.
POMBAL
E A REFORMA EDUCACIONAL
A política educacional como outra qualquer de Pombal era lógica,
prática e centrada nas relações econômicas
anglo-portuguesa.
A reforma educacional pombalina culminou com a expulsão
dos jesuítas precisamente das colônias portuguesas,
tirando o comando da educação das mãos destes
e passando para as mãos do Estado. Os objetivos que conduziram
a administração pombalina a tal reforma, foram assim,
um imperativo da própria circunstância histórica.
Extintos os colégios jesuítas, o governo não
poderia deixar de suprir a enorme lacuna que se abria na vida educacional
tanto portuguesa como de suas colônias.
Para o Brasil, a expulsão dos jesuítas significou,
entre outras coisas, a destruição do único
sistema de ensino existente no país. Para Fernando de Azevedo,
foi “a primeira grande e desastrosa reforma de ensino no
Brasil”. Como bem colocou Niskier,
“A
organicidade da educação jesuítica foi consagrada
quando Pombal os expulsou levando o ensino brasileiro ao caos,
através de suas famosas ‘aulas régias’,
a despeito da existência de escolas fundadas por outras ordens
religiosas, como os Beneditinos, os franciscanos e os Carmelitas”.
(Niskier, 2001, p. 34)
Enquanto na Metrópole buscava-se construir um sistema
público de ensino, mais moderno e popular, na colônia,
apesar das várias tentativas, através de sucessivos
alvarás e cartas régias, as Reformas Pombalinas no
campo da educação, só logrou desarranjar a
sólida estrutura educacional construída pelos jesuítas,
confiscando-lhes os bens e fechando todos os seus colégios.
É importante destacar que a reforma pombalina no Brasil
não foi implementada no mesmo momento e da mesma forma que
em Portugal. Foi
de quase trinta anos o tempo de que o Estado português necessitou
para assumir o controle pedagógico da educação
a ser oferecida em terras brasileiras; da completa expulsão
dos jesuítas e do desmantelamento sistemático de
seu aparelho educacional, dos métodos aos materiais didáticos,
até a nomeação de um Diretor Geral dos Estudos
que deveria, em nome do Rei, nomear professores e fiscalizar sua
ação na colônia.
Através do Alvará Régio de 28 de junho de 1759, o
Marquês de Pombal, suprimia as escolas jesuíticas
de Portugal e de todas as colônias ao expulsar os jesuítas
da colônia e, ao mesmo tempo, criava as aulas régias
ou avulsas de Latim, Grego, Filosofia e Retórica, que deveriam
suprir as disciplinas antes oferecidas nos extintos colégios
jesuítas.
Estas providências, entretanto, não foram suficientes
para assegurar a continuidade e a expansão das escolas brasileiras,
constantemente reclamadas pelas populações que até então
se beneficiavam dos colégios jesuítas. Portugal logo
percebeu que a educação no Brasil estava estagnada
e era preciso oferecer uma solução.
Somente quando a Real Mesa Censória,
criada em 1767 (inicialmente com atribuição para
examinar livros e papéis já
introduzidos e por introduzir em Portugal), alguns anos depois,
passa a assumir a incumbência da administração
e direção dos estudos das escolas menores de Portugal
e suas colônias, é que as reformas na instrução
ganham meios de implementação. Com as novas incumbências
e a partir das experiências administrativas da direção
geral de estudos, nos anos anteriores, a Mesa Censória apontou
para as necessidades tanto na metrópole quanto na colônia
referente ao campo educacional. Assim, os estudos menores ganharam
amplitude e penetração com a instituição,
em 1772, do chamado “subsídio literário” para manutenção dos ensinos
primário e secundário. Como Carvalho (1978) bem
explicitou:
“Com
os recursos deste imposto, chamado subsídio literário,
além do pagamento dos ordenados aos professores, para o
qual ele foi instituído, poder-se-iam ainda obter as seguintes
aplicações: 1) compra de livros para a constituição
da biblioteca pública, subordinada à Real Mesa Censória;
2) organização de um museu de variedades; 3) construção
de um gabinete de física experimental; 4) ampliação
dos estabelecimentos e incentivos aos professores, dentre outras aplicações” (Carvalho,
1978, p. 128).
Dessa forma, foi implantado o novo sistema educacional que
deveria substituir o sistema jesuítico. Aberto que estava à modernidade
européia, incorporou partes do discursos sobre a ação
do Estado na educação e passou a empregá-lo
para ocupar o vácuo que foi deixado com a saída dos
jesuítas, pelo menos no que diz respeito ao controle e gestão
administrativa do sistema escolar.
O NOVO SISTEMA
Como vimos, foi através do Alvará Régio
de 28 de junho de 1759 que o Marquês de Pombal, ao mesmo
tempo expulsou os jesuítas de Portugal e de suas colônias,
suprimindo as escolas e colégios jesuíticas de Portugal
e de todas as colônias; criou as aulas régias ou avulsas
de Latim, Grego, Filosofia e Retórica, que deveriam substituir
os extintos colégios jesuítas e criou a figura do “Diretor
Geral dos Estudos”, para nomear e fiscalizar a ação
dos professores.
As aulas régias eram autônomas e isoladas, com
professor
único e uma não se articulava com as outras. Destarte,
o novo sistema não impediu, a continuação
do oferecimento de estudos nos seminários e colégios
das ordens religiosas que não a dos jesuítas (Oratorianos,
Franciscanos e Carmelitas, principalmente).
Em lugar de um sistema mais ou menos unificado, baseado na
seriação dos estudos, o ensino passou a ser disperso
e fragmentado, baseado em aulas isoladas que eram ministradas por
professores leigos e mal preparados.
Com a implantação do subsídio literário,
imposto colonial para custear o ensino, houve um aumento no número
de aulas régias, porém ainda muito precário
devido à escassez de recursos, de docentes preparados e
da falta de um currículo regular. Ademais, vemos uma continuidade
na escolarização baseada na formação
clássica, ornamental e europeizante dos jesuítas,
isto porque a base da pedagogia jesuítica permaneceu a mesma,
pois os padres missionários, além de terem cuidado
da manutenção dos colégios destinados à
formação dos seus sacerdotes, criaram seminários
para um clero secular, constituído por “tios-padres” e “capelães
de engenho”, ou os chamadas
“padres-mestres” Estes, dando continuidade à sua
ação pedagógica, mantiveram sua metodologia
e seu programa de estudos, que deixava de fora, além das
ciências naturais, as línguas e literaturas modernas,
em oposição ao que acontecia na Metrópole,
onde as principais inovações de Pombal no campo da
educação como o ensino das línguas modernas,
o estudo das ciências e a formação profissional
já se faziam presentes. Por isso, se para Portugal as reformas
no campo da educação, que levaram a laicização
do ensino representou um avanço, para o Brasil, tais reformas
significaram um retrocesso na educação escolar com
o desmantelamento completo da educação brasileira
oferecida pelo antigo sistema de educação jesuítica,
melhor estruturado do que as aulas régias puderam oferecer.
“O Brasil não é contemplado com as novas propostas
que objetivavam a modernização do ensino pela introdução
da filosofia moderna e das ciências da natureza, com a finalidade
de acompanhar os progressos do século. Restam no Brasil,
na educação, as aulas régias para a formação
mínima dos que iriam ser educados na Europa”. (Zotti,
2004, p. 32)
Nas Instruções do Alvará Régio de 1759 X,
transparece claramente o objetivo que norteou a reforma na instrução.
A preocupação básica era de formar o perfeito
nobre, simplificando os estudos, abreviando o tempo do aprendizado
de latim, facilitando os estudos para o ingresso nos cursos superiores,
além de propiciar o aprimoramento da língua portuguesa,
diversificar o conteúdo, incluir a natureza científica
e torná-los mais práticos.
Em substância, tal Alvará teve como significado central a
tentativa de manter a continuidade de um trabalho pedagógico
interrompido pela expulsão dos jesuítas. A educação
jesuítica não mais convinha aos interesses comerciais
emanados por Pombal, com seus conhecidos motivos e atos na tentativa
de modernização de Portugal, que chegariam também
as suas colônias. Assim sendo, as escolas da Companhia de
Jesus que tinham por objetivo servir aos interesses da fé não
atendiam aos anseios de Pombal em organizar a escola para servir
aos interesses do Estado.
É dentro desta ordem e em nome dela que o Alvará de
1759 pode ser visto como o primeiro esforço no sentido da
secularização das escolas portuguesas e de suas colônias,
entendendo que somente um ensino, dirigido e mantido pelo poder
secular, poderia corresponder aos fins da ordem civil.
A ingerência do Estado nas questões de educação
começa a ganhar vulto a partir do deste período,
concomitante com a idéia do desenvolvimento de sistemas
nacionais de educação, ligados aos processos político-sociais
de consolidação dos Estados Nacionais europeus.
Seguindo nesta direção, com uma ação
intensiva, o Estado português assume definitivamente o controle
da educação colonial. A criação da
figura do “Diretor Geral dos Estudos” deixa bem clara,
no mesmo “Alvará”, a intenção
da Coroa de uniformizar a educação na Colônia
e fiscalizar a ação dos professores — desde
já por ela nomeados — do material didático
por eles utilizado — também devidamente “recomendado” no
mesmo documento — de modo a que não houvesse choque
de interesses — isto é, que não houvesse nenhum
outro poder, como era o dos jesuítas, a afrontar as determinações
da Coroa. Cabe à
Coroa a instalação de um novo sistema de ensino,
e é exatamente essa a linha pela qual segue o Alvará Régio.
As aulas régias instituídas por Pombal para substituir
o ensino religioso constituíram, dessa forma, a primeira
experiência de ensino promovido pelo Estado na história
brasileira. A educação a partir de então,
passou a ser uma questão de Estado. Desnecessário
frisar que este sistema de ensino cuidado pelo Estado servia a
uns poucos, em sua imensa maioria, filhos das incipientes elites
coloniais.
Pedagogicamente, esta nova organização não
representou um avanço. Mesmo exigindo novos métodos
e novos livros, no latim a orientação era apenas
de servir como instrumento de auxílio à língua
portuguesa, o grego era indispensável a teólogos,
advogados, artistas e médicos, a retórica não
deveria ter seu uso restrito a cátedra. A filosofia ficou
para bem mais tarde, mas efetivamente nada de novo aconteceu devido
principalmente, às dificuldades quanto à falta de
recursos e pessoal preparado.
As transformações no nível secundário
não afetaram o fundamental, que permaneceu desvinculado
da realidade, e buscando o modelo de exterior "civilizado".
Quem tinha condições de cursar o ensino superior
enfrentava os perigos das viagens, para freqüentar a Universidade
de Coimbra ou outros centros europeus. Como as "Reformas Pombalinas"
visavam transformar Portugal numa metrópole como a Inglaterra,
a elite masculina deveria buscar respaldo fora, para poder servir
melhor na sua função de articuladora dos interesses
da camada dominante.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Os 27 anos de governo de Pombal caracterizaram-se por uma tentativa de
modernização da sociedade e de desenvolvimento da
economia portuguesa.A peculiaridade de Portugal nessa época
foi a coincidência do iluminismo com a luta do Estado português
para voltar a ser a grande nação da época
dos descobrimentos - por meio do fortalecimento do Reino e seu
soberano - adaptando-se às técnicas que acreditava
terem sido utilizadas pelos seus rivais para ultrapassá-lo
- ainda que para tanto devesse
se apoiar nas novas idéias da Ilustração,
que não poupavam críticas a sua ordem política
e social já considerada velha - Pombal tinha essa missão.
Foi um homem eclético, pragmático e
obstinado, disposto a tirar de seu caminho tudo que lhe impedisse
de alcançar seus objetivos. - em inúmeras oportunidades
entrou em conflito com membros da nobreza e do clero – como
se percebe a controvérsia
está no núcleo da ação pombalina, na
combinação particular de métodos que ele utilizou.
Eles refletem seu posicionamento entre oportunidade e necessidade. Era
a oportunidade e seu senso prático que o faziam agir independentemente
do julgamento de quem quer que fosse. Isso se esclarece por meio
das grandes reformas perpetradas por Pombal, como por exemplo: A reconstrução
de Lisboa foi possível pela catástrofe do terremoto
de
1755. A
reforma da área militar seguiu-se à invasão
espanhola de 1762. Sua reforma do sistema educacional foi o resultado
inevitável da expulsão dos jesuítas. A crescente ênfase
nas manufaturas que ocorriam na época acompanhou a criação
de um ambiente econômico favorável à substituição
das importações.
Portanto, a praticidade, às
vezes perversa de Pombal, se traduz nas atividades e reformas estabelecidas
pelo Marquês na defesa do absolutismo. Na verdade tratava-se
de um oportunista cuja hábil manipulação das
circunstâncias nas quais não lhe importavam os métodos,
colocou o poder do Estado como o maior de seus objetivos, tendo
sido, nesse sentido, o maior reformador de seu tempo. Tratava-se,
portanto de manobras sociais para o fortalecimento estado absolutista
de Portugal.
Embora a Metrópole portuguesa só abrisse perspectivas para
a penetração de um Iluminismo contido, científico
na aparência, já que permaneceria submetido à tradição
cultural da imitação, memorização e
erudição literária, houve um avanço
no ensino público português, que passou a formar uma
burocracia administrativa mais moderna e eficiente. Além
disso, os professores régios que aqui exerciam a profissão
de ensinar, foram propulsionadores dos sentimentos liberais e incentivadores
das idéias filosóficas que tão significativamente
se fizeram atuantes nos últimos trinta anos que antecederam
a independência do país.
É muito interessante perceber por quais vias o iluminismo implantou-se
no Brasil. É justamente através da política
imperial de racionalização e padronização
da administração de Pombal que a educação
passou para as mãos do Estado, mas essa educação
que passou a ser pública, não se faz para os interesses
dos cidadãos. Ela serviu aos interesses imediatos do Estado,
que para garantir seu status absolutista precisa manter-se forte
e centralizado nas mãos e sobre comando de uns poucos preparados
para tais tarefas. Assim, mesmo que aparentemente as ações
de Pombal induzam ao entendimento de uma política despótica
de benefícios individuais - idéia que não é de
toda inválida - é preciso acordar com a análise
de Maxwell de que os lucros das reformas pombalinas foram individuais,
privados. Mas os interesses foram públicos - no sentido
de estatal - na medida em que naquele contexto, iluminismo, racionalidade
e progresso têm um significado muito diferente aos quais
se deve estar atento: iluminismo no contexto da colônia brasileira
tratou-se, na verdade do engrandecimento do poder do Estado e não
das liberdades individuais, Dessa forma, entender o projeto do
iluminismo pombalino talvez seja a chave para ajudar a perceber
a tradição reformista nas tentativas de construção
de um sistema nacional de educação pública
realmente voltado aos interesses públicos, que até hoje
não se consolidou no Brasil.
BIBLIOGRAFIA
BAUSBAUM,
Leônico. História
sincera da República: das origens até 1889. Rio
de Janeiro: Livraria São José, 1957.
BELLOTTO,
Heloísa Liberalli. Arquivos
Permanentes: tratamento documental. 2 ed. ver. ampl.. Rio de
Janeiro: Editora Da FGV, 2004.
CARVALHO,
Laerte Ramos de. As Reformas
Pombalinas da Instrução Pública. São
Paulo: Saraiva: Ed. Universidade de São Paulo, 1978.
MAXWELL,
Kenneth. Marquês de Pombal - Paradoxo do Iluminismo.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
NISKIER,
Arnaldo. Educação
Brasileira: 500 anos de História. Rio de Janeiro: FUNARTE,
2001.
RIBEIRO,
Maria Luíza Santos. História
da Educação Brasileira: a organização
escolar. 18 ed. ver. ampl.. Campinas: Autores Associados, 2000.
XAVIER,
Maria Elizabete Sampaio Prado. História
da Educação: a escola no Brasil. São Paulo:
FTD, 1994.
ZOTTI,
Solange Aparecida. Sociedade,
Educação e Currículo no Brasil: dos jesuítas
aos anos de 1980. Campinas: Autores Associados, 2004.