Nasceu em 26 de outubro de 1922 em Montes Claros, Minas
Gerais. Depois de abandonar o curso de Medicina, matriculou em 1944 na Escola
de Sociologia e Política de São Paulo. Entre 1947 e 1957 trabalhou com o
Marechal Rondon no Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Contratado por Anísio
Teixeira, assumiu em 1957 a direção da Divisão de Estudos Sociais do Ministério
de Educação e Cultura. Tornou-se um "discípulo" de Anísio Teixeira na
defesa da escola pública e juntos influenciaram o processo de elaboração da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1961. Foi o primeiro reitor da
Universidade de Brasília e Ministro da Educação e Cultura do governo João
Goulart. Após o golpe de 1964, exilou-se no Uruguai, Venezuela, Peru, Chile,
entre outros países. Com a anistia, em 1979, associou-se à Leonel Brizola, para
reorganizar o velho Partido Trabalhista Brasileiro. Em 1982, como
vice-governador do Rio de Janeiro e coordenador do Programa Especial de
Educação, criou os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps)
e as Casas da Criança, que integravam o atendimento de saúde e educação a
crianças de 0 a 6 anos. Em 1986, assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Social
de Minas Gerais, na tentativa frustrada de implantar os Cieps.
Como senador em 1990, foi relator do anteprojeto aprovado da nova Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), que passou a ser conhecida como
Lei Darcy Ribeiro. No segundo mandato de Leonel Brizola no Rio de Janeiro,
coordenou o 2° Programa Especial de Educação chegando a marca de 500 Cieps, escolas públicas de tempo integral. Autor de
diversos livros, faleceu em 17 de fevereiro de 1997.
Educador, sociólogo, etnólogo, poeta,
romancista, antropólogo, político: o multitalentoso
Darcy Ribeiro deixou um legado sem parâmetros no pensamento brasileiro
Filho de farmacêutico e professora, o jovem
Darcy Ribeiro, provavelmente por influência dos pais, estudou medicina durante
três anos – até ter a convicção de que o interesse dele não era a fisiologia do
corpo humano. A verdadeira motivação desse mineiro, que nasceu no ano da Semana
de Arte Moderna e cresceu testemunhando a crueldade da seca e dos grandes
latifundiários, era entender porque o Brasil era um país que teimava em não dar
certo.
Antropólogo, educador, intelectual, romancista
e político: Darcy Ribeiro foi um homem difícil de caber numa única definição.
Quando trocou a faculdade de Medicina, em Belo Horizonte, pela de Ciências
Sociais, na Escola de Sociologia e Política, em São Paulo, começou o desenhar
uma trajetória que o tornaria conhecido e respeitado em todo o mundo.
O antropólogo viveu dez anos junto às
populações indígenas. Desse período, resultaram algumas das suas principais
obras – entre elas Kadiwéu, coletânea de ensaios
sobre o saber, o azar e a beleza, considerados um clássico da etnologia, da
mitologia e da arte dos antigos índios Guaicurus.
Outro importante trabalho é Diários Índios, em
que reproduz na íntegra as anotações feitas durante as expedições com os índios
Urubu-Kaapor, nos anos de 1949 e 1951, época em que
trabalhava no extinto SPI (Serviço de Proteção aos Índios). Lá, conheceu o
Marechal Cândido Rondon, que presidia o Conselho Nacional de Proteção aos
Índios e que acabou por influenciar, profundamente, o trabalho que desenvolvia
junto às comunidades indígenas.
Na relação de feitos do antropólogo Darcy
Ribeiro estão as criações do Museu do Índio e do Parque Nacional do Xingu.
Todos esses anos de convívio e estudo da cultura indígena e dezenas de livros
acabaram resultando em uma das publicações mais importantes do etnólogo Darcy
Ribeiro: O Povo Brasileiro. O autor consumiu 30 anos de trabalho até terminar
esse que é um dos mais fiéis retratos da formação do povo brasileiro.
Em Darcy Ribeiro, o educador sempre andou lado
a lado com o político. Bom exemplo disso foi a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional – um de seus grandes sonhos, concretizado quando se tornou
senador. A LDB, aprovada durante o período de convalescença do câncer que o
levaria à morte, em 1996, determina as condições para um ensino com eqüidade,
competência e qualidade, além de defender a integração com a comunidade,
educação a distância e excelência na formação do magistério. A lei especifica,
ainda, critérios para avaliação e credenciamento de universidades. Enfim, os eixos
fundamentais para a melhora da educação no país.
O educador-político, durante o governo de
Juscelino Kubitschek, foi o responsável pela criação da UnB, a Universidade de
Brasília, até hoje referência de qualidade entre as universidades do país.
Darcy Ribeiro foi seu primeiro reitor até assumir, no governo parlamentarista
de João Goulart, a pasta de ministro da Educação.
No exílio, depois de ter seus direitos
políticos cassados pela ditadura militar, em 1964, ajudou a criar escolas e
universidades nos países latino-americanos onde buscou refúgio até poder voltar
ao Brasil, com a Lei da Anistia.
Nas primeiras eleições livres para governo de
Estado, depois da ditadura, em 1982, foi eleito vice-governador do Rio de
Janeiro, na chapa encabeçada por Leonel Brizola. E foi ocupando mais esse cargo
político que o educador realizou uma das suas obras mais polêmicas e
revolucionárias: os Cieps, que, na definição de
Darcy, representavam o ponto mais expressivo de sua crença no ensino básico
para os segmentos historicamente marginalizados.
Os Cieps eram
escolas públicas, de período integral, onde as crianças cursavam disciplinas
curriculares e recebiam alimentação de qualidade e acompanhamento
médico-odontológico, além de praticarem atividades esportivas. Para abrigar essa
"nova escola" foram construídos prédios próprios, projetados por
Oscar Niemeyer, o grande arquiteto de Brasília e amigo de Darcy.
Ativo defensor da democratização do ensino
público gratuito, foi também o idealizador da universidade Norte Fluminense,
concebida quando era vice-governador do Rio e concretizada no governo seguinte.
O intelectual Darcy Ribeiro não se restringiu
apenas à academia. Autor de vasta e rica literatura científica, foi além e se
mostrou um competente literato. Ao todo, foram cinco romances, um ainda
inédito, contra mais de duas dezenas de livros e ensaios voltados para o mundo
do conhecimento.
A primeira tentativa de escrever um romance
foi ainda na juventude, ao 20 anos. Lapa Grande, um texto com cerca de 250
páginas, conta a agruras de um cego que recupera a visão e se surpreende com a
feiúra da mãe. A experiência mal sucedida acabou afastando o jovem Darcy da
ficção e dando impulso à carreira de escritor de livros científicos.
Muitos anos depois, já no exílio, fez uma nova
tentativa, dessa vez com sucesso. Em Mayra, o
antropólogo usou todo o conhecimento que tinha sobre hábitos e cultura
indígenas para escrever "o drama de Avá, uma
espécie de índio-santo sofredor, na sua luta impossível para mudar de couro,
deixando de ser sacerdote cristão para voltar à sua indianidade
original", como o próprio autor resumia a sua obra.
Nos seus quatro livros publicados (seguiram-se
O Mulo, Utopia Selvagem e Migo) se percebe a angústia
do antropólogo que chegou à conclusão de que o Brasil não deu certo por ser
"um país enfermo de desigualdades", resultado de "uma
mentalidade que permanece viva e ativa nas nossas classes dominantes rústicas,
que continuam a fazer do Brasil um engenho de gastar gente".
Darcy era um homem alegre e de bom humor
imbatível. Usina constante de idéias, muitas vezes atropelava as palavras ao
falar. Os lábios nem sempre eram capazes de verbalizar pensamentos na mesma
velocidade com que o cérebro as processava. Toda essa energia não era
suficiente para afogar a angústia de suas decepções – ou fracassos, como ele
mesmo gostava de definir. Celebrado com o título de Doutor Honoris
Causa, pela universidade francesa de Sorbonne,
dedicou-o às suas "derrotas". Afirmava, com lucidez e coragem:
"Somei mais fracassos que vitórias em minhas lutas, mas detestaria estar
no lugar de quem venceu".
Apesar de toda a importância da bibliografia
de Darcy Ribeiro, seu último livro, um romance, permanece guardado numa gaveta
à espera de alguma editora. As Histórias Gáticas
conta a história, infanto-juvenil, de um gato ridicularizado pelos demais por
acreditar ser dono de um rabo de galo, uma espécie mutante, que sonhava em ter
filhos alados. Essa foi a segunda incursão literária dele pelo mundo
infanto-juvenil (ele já tinha publicado Noções de Coisas, com ilustrações de
Ziraldo).
Darcy também deixou, inéditos, um livro de
poemas eróticos, Eros e Tanatos, e um romance urbano,
Jóxua, escrito quando ele já estava muito doente. O
texto relata as aventuras e dramas de um adolescente que deixa a família depois
de sofrer violência sexual – e acaba se tornando garoto de programa em
Copacabana. O autor escreveu todo o livro a mão, em manuscritos de letra miúda,
resultando em originais incompreensíveis.
Seu livro de memórias, Confissões, foi concluído 40 dias antes de
morrer. Com ilustrações de Niemeyer, a autobiografia é um relato carinhoso, mas
em tom de zombaria, às vezes irado, em que não poupa ninguém, nem a si mesmo.
No livro há histórias da família, como a da bisavó que casou o amante com a
filha de 12 anos, para, segundo ele, "tê-lo sempre junto de si".
Darcy também não esquece de relatar os fatos vividos ao longo dos seus 74 anos,
como a relação com a literatura, os índios, a política e os políticos. Dos
tempos da juventude, lembra de casos interessantes, como sua primeira amante,
uma prostituta da cidade onde nasceu. Levado ao prostíbulo, com 15 anos, o
jovem Darcy foi indagado pela experiente prostituta, chamada Almerinda:
"Você já viu mulher nua?". "Já, sim senhora", respondeu
Darcy. "Senhora é a sua mãe!", teve que ouvir.
Produção Bibliográfica
Religião e Mitologia Kadiwéu
América Latina, a Pátria Grande (Guanabara)
Configuração Histórico Cultural dos Povos Americanos (Civilização Brasileira)
Ensaios Insólitos (LP&M)
Mayra (Civilização Brasileira)
Migo (Record)
Nossa Escola é uma Calamidade (Salamandra)
Sobre o Óbvio (Guanabara)
Testemunho (Siciliano)
Aos Trancos e Barrancos (Guanabara)
Uirá Sai à Procura de Deus (Paz e Terra)
A Universidade Necessária (Paz e Terra)
Universidade para quê? (UnB)
Utopia Selvagem (Record)
As Américas e a Civilização (Vozes)
Os Brasileiros (Vozes)
Dilema da América Latina (Vozes)
Formas e Sistemas de Governo (Vozes)
A Fundação do Brasil (Vozes)
Os Índios e a Civilização (Vozes)
Processo Civilizatório (Vozes)
Teoria do Brasil (Paz e Terra)
Povo Brasileiro (Companhia das Letras)
Noções de Coisas (FTD)
Diário Índios (Companhia das Letras)
Confissões (Companhia das Letras)
Fonte: Revista Educação (nº
34)
Fonte (biografia): Fontes
de Educação: Guia para Jornalistas. Fórum Mídia & Educação, 2001
Coordenação e Edição (biografia): Denise
Carreira
Textos (biografia): Adriano
Quadrado, Denise Carreira e Iracema Nascimento
Maria
Isabel Moura Nascimento. GT; Campos Gerias-PR
Universidade Estadual de Ponta GROSSA-PR