Criador da idéia de "aldeia global" trouxe para a educação novo
enfoque, baseado em suas teorias sobre comunicação. "Uma
rede mundial de ordenadores tornará acessível, em alguns minutos, todo o tipo
de informação aos estudantes do mundo inteiro". Em tempos de internet,
essa frase é óbvia. Quando foi dita, há 25 anos atrás, parecia extraída de um
livro de ficção. O autor, um canadense chamado Marshall McLuhan, foi chamado de
sonhador a louco, conforme a simpatia que suas idéias provocavam.
Em1964, McLuhan publicou um livro chamado Understanding Media, que, em
português ganhou o título de Os meios de comunicação como extensões do homem.
Ao publicá-lo, talvez não imaginasse que estava lançando um dos clássicos da
comunicação – mais discutido do que lido, mais desprezado do que estudado.
A grande novidade do autor em relação à educação é o enfoque, baseado em suas
teorias sobre comunicação – mais uma vez, adiantando-se à criação de um campo
de estudos, Comunicação e Educação, que só seria explorado na década dos 90.
"Em nossas cidades, a maior parte da aprendizagem ocorre fora da sala de
aula. A quantidade de informações transmitidas pela imprensa excede, de longe,
a quantidade de informações transmitidas pela instrução e textos
escolares", explica McLuhan, em seu livro Revolução na Comunicação.
McLuhan propõe que, até o surgimento da televisão, vivíamos na "galáxia de
Gutemberg" onde todo o conhecimento era visto apenas em sua dimensão
visual. Sua idéia é simples: antigamente, o conhecimento era transmitido
oralmente, por lendas, histórias e tradições. Quando Gutemberg inventou a
imprensa, permitiu que o conhecimento fosse mais difundido. Mas, por outro
lado, reduziu a comunicação a um único aspecto, o escrito. "Antes da
imprensa, o jovem aprendia ouvindo, observando, fazendo. A aprendizagem tinha
lugar fora da aula", explica o autor.
Lauro de Oliveira Lima, um dos maiores especialistas brasileiros em Jean Piaget
mostra, em Mutações em Educação Segundo
McLuhan, que "o professor brasileiro não atingiu sequer a utilização
do livro. Comporta-se ainda como o 'lector' medieval que recitava papiros e
pergaminhos para uma platéia analfabeta".
Crítico feroz da escola tradicional, o autor canadense aponta os defeitos do
sistema atual, que, segundo ele, prefere criticar a mídia, em vez de utilizá-la
como aliada na educação. "Poucos estudantes conseguem adquirir
proficiência na análise de um jornal. Ainda menos têm capacidade para discutir
com inteligência um filme." Irônico, afirma que "a educação escolar
tradicional dispõe de um impressionante acervo de meios próprios para suscitar
em nós o desgosto por qualquer atividade humana, por mais atraente que seja na
partida".
Um erro, em sua concepção, é a orientação da escola com vistas exclusivas ao
mercado de trabalho. "A educação era, até agora, uma tarefa relativamente
simples: bastava descobrir as necessidades da máquina social e depois recrutar
e formar o pessoal que a elas correspondesse", explica o autor no livro de
Oliveira Lima.
Mais do que a matéria extraída de livros, afirma McLuhan, o ponto de partida
para a educação é a vontade do aluno em aprender. "Onde o interesse do
estudante já estiver focalizado, aí se encontra o ponto natural de elucidação
de seus problemas e interesses", completa. "A educação escolar
tradicional suscita em nós o desgosto por qualquer atividade humana"
Um de seus mais famosos conceitos é o de "aldeia global". Em seu
livro O meio é a massagem afirma que "a nova interdependência
eletrônica cria o mundo à imagem de uma aldeia global". Quando ele falou
isso, a coisa mais parecida com internet que existia eram as redes de
computadores militares norte-americanas. Computador pessoal era apenas um sonho,
distante.
A evolução tecnológica deixa, aqui, de ser mera coadjuvante na vida social: o
que é dito é condicionado pela maneira como se diz. O próprio meio passou a ser
a principal atração, a informação. Muitas das páginas que estão na internet,
por exemplo, poderiam ser livros ou revistas, mas, segundo McLuhan, tornam-se
interessantes justamente por que estão em um novo meio de comunicação.
Isso não significa, é claro, ser passivo diante da mídia. "A tarefa
educativa não é fornecer, unicamente, os instrumentos básicos da percepção, mas
também desenvolver a capacidade de julgamento e discriminação através da
experiência social corrente", diz o autor.
Uma das mais curiosas idéias de McLuhan é a de que "os meios de comunicação
são extensões do homem". Assim como se usa uma pinça para aumentar a
precisão das mãos e uma chave de fenda para girar um parafuso, os meios de
comunicação seriam, na verdade, extensões dos sentidos do homem. Os óculos, por
exemplo, são extensões do olho, a roupa é uma extensão da pele, a roda do carro
é uma extensão do pé. Com a internet, não deixa de ser curioso se falar em
"relações virtuais", como se as máquinas fossem realmente capazes de
sentir e pensar pelos seus operadores.
Muito antes de alguém falar em "aspectos lúdicos da educação",
McLuhan já dizia que o estudo deveria ser uma atividade divertida. A escola,
para ele, ainda não tinha percebido essa realidade óbvia. E completa: "É
ilusório supor que existe qualquer diferença básica entre entretenimento e
educação. Sempre foi verdade que tudo o que agrada ensina mais
eficazmente".
O pajé da
aldeia global
Herbert Marshall McLuhan nasceu em 1911, no Canadá. Formado pela Universidade
de Manitoba, lecionou em diversas faculdades de seu país até conseguir o Ph.D.
em Cambridge, em 1942. Tornou-se professor titular de literatura na
Universidade de Toronto em 1952, cargo que exerceu durante toda a sua vida.
Autor de inúmeros artigos para revistas científicas, tornou-se mundialmente famoso
em 1964 ao publicar Understanding Media, onde expunha suas teses sobre a
tecnologia e o conhecimento. Acumulando prêmios, defensores e inimigos, McLuhan
publicou outros livros divulgando suas idéias, mantendo sempre a linha polêmica
até sua morte, em 1980.
O profeta da eletrônica deixou muitos livros e artigos; a
maioria esgotados no Brasil, alguns facilmente encontrados em sebos
Os meios de comunicação como extensões do
homem (Cultrix)
A Galáxia de Gutemberg (Cultrix)
Revolução na Comunicação, (Jorge Zahar)
O meio é a massagem, (Record)
Sobre o autor:
Mutações em Educação segundo McLuhan (Vozes)
Fonte: Revista Educação (nº 46, 10/2001)
Maria Isabel Moura Nascimento. GT: Campos
Gerais-PR-Universidade Estadual de Ponta Grossa-UEPG