O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO: o encerramento de uma experiência de formação docente nos anos 30

 

Olinda Evangelista*

 

RESUMO

 

O presente texto tem o objetivo de expor a recuperação histórica dos motivos que levaram o Interventor Federal Ademar de Barros, em conluio com a Igreja Católica, a encerrar a primeira experiência nacional de formação de professor em nível universitário. Iniciada em 1934, no interior da Universidade de São Paulo, foi violentamente terminada em 1938, simultaneamente ao encerramento da Universidade do Distrito Federal. O método de trabalho privilegiou o estudo da documentação relativa ao acontecimento assim como a revisão da literatura existente sobre o tema. De posse desse material histórico foi possível reconstruir os argumentos usados pelo Governo de Aademar de Barros para justificar sua arbitrariedade. Ademais, foi possível apreender esse episódio como parte das iniciativas do Estado Getulista de afirmar seu próprio modelo de formação docente, configurado na Faculdade Nacional de Filosofia, em 1940.

 

 

PALAVRAS-CHAVES: HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO; FORMAÇÃO DO PROFESSOR; INSTITUTO DE EDUCAÇÃO; UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

 


 

O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO:

o encerramento de uma experiência de formação docente nos anos 30

 

Introdução

 

            A intenção desse texto é reconstruir historicamente a trajetória acadêmica da primeira experiência brasileira de formação do professor em nível universitário, iniciada em 1934, no Instituto de Educação da Universidade de São Paulo - IEUSP. Essa trajetória foi arbitrariamente encerrada pelo governo interventor de Ademar de Barros, em 1938, com a ajuda das hostes católicas, contendores importantes de Fernando de Azevedo, diretor do IEUSP. A pesquisa levou à constituição de um corpus documental consistente que permitiu reconstituir os argumentos utilizados pelo Estado, supostamente explicativos do episódio, bem como os utilizados pelos catedráticos, que buscavam reverter a situação em que foram colocados. A investida dos catedráticos não encontrou acolhida nos governos estadual e federal, interrompendo-se, assim, um modelo importante de formação universitarizada do mestre primário e secundário.

 

O encerramento do IEUSP

 

A situação em que Azevedo exprimiu sua desilusão em relação ao encerramento arbitrário das atividades do Instituto de Educação da USP era grave: “Destes cinco anos de trabalho ininterrupto que ficou, que me reservaram? Da obra, nada ficou: foi tudo integralmente destruído. Não ficou pedra sobre pedra. É como se tivesse passado um furacão. Tomaram-nos de assalto os edifícios e as instalações, que pertencem ao Instituto e à Universidade, secretaria, biblioteca, laboratórios, contínuos e entregaram a uma instituição igual às outras escolas normais e estranha e inincorporável a um sistema universitário”( Azevedo apud PENNA, 1987, p.122).

Tal gravidade dava-se não só pelo que significou de agressão à sua pessoa, mas pelo que conteve de estratégia de contenção de um projeto pedagógico em franca organização. Em carta a Venâncio Filho afirmou que ofereceria em sacrifício sua própria vida caso fosse impossível lutar em favor da educação nacional (PENNA, 1987). Parece não haver exagero quanto ao fato de que uma estrutura grandiosa foi destruída. Muitos foram os motivos alegados pelo Interventor Federal, Ademar de Barros, para o encerramento do Instituto. Sob o ácido gosto dos argumentos administrativos, corriam motivações de sabores diferentes.

Recuperar o processo histórico que resultou na extinção do IEUSP assim como discutir algumas interpretações correntes sobre o episódio é tarefa necessária para compreender-se o duro golpe desferido contra a formação superior de professores no país. De outro lado, importa também para entender-se como Fernando de Azevedo, seu diretor, registrou o ocorrido, elidindo importantes informações sobre essa iniciativa pioneira no Brasil.

 

Os argumentos do Estado e a defesa dos docentes

 

A decisão do Interventor Federal do Estado de São Paulo foi tomada por decreto - n°. 9.269 - em junho de 1938. A reação eclodiu em 27 de agosto com a publicação de entrevista com Ademar de Barros na qual elencava dez razões para sua decisão, imediatamente contestadas por alguns professores que publicaram carta no jornal A Noite, do Rio de Janeiro (ALMEIDA JR., 1966). A primeira contenda deu-se em relação à legalidade do fato dado que o Interventor entendia que seu procedimento respeitava a legislação. Entretanto, ferira a legislação federal e os Estatutos da Universidade de São Paulo ao não respeitar a exigência de participação do Conselho Universitário, do Conselho Nacional de Educação (CNE), do Ministério da Educação e Saúde e da Presidência da República na referida decisão (Decreto nº.19.851, de 11 de abril de 1931, e Decreto nº.6.283, de 25 de janeiro de 1934). Por essas leis, comprovava-se, segundo os professores, que a atitude do governo padecia de sustentação legal.

Mas essa não foi a única alegação. Barros entendia que o Instituto subordinava a si o Jardim de Infância, a Escola Primária e a Escola Secundária, o que não cabia a uma instituição de ensino superior. Já para os professores, tal entendimento revelava sua ignorância pois as escolas eram anexas, de caráter experimental, e apenas o Instituto fazia parte da USP. Essas davam suporte às práticas pedagógicas e experimentais das diversas Cadeiras e seus laboratórios. Evidentemente havia ascendência política sobre as escolas anexas de Azevedo. As bancas de concurso para Catedráticos da Escola Secundária eram definidas pela Congregação do IEUSP; os professores eram remanejados de um nível para outro, ignorada a diferença institucional. O corpo docente do Colégio Universitário era constituído de Catedráticos da Escola Secundária e Assistentes do IEUSP. É de se reconhecer, pois, que seus tentáculos atingiam todas as unidades do Instituto que, sendo dividido administrativamente, na prática operava como um sistema de ensino. Politicamente, portanto, Azevedo granjeava significativos dividendos.

Argumentava ainda Barros que o Instituto custava uma fortuna por sustentar tais escolas. Contra-argumentaram os professores que o orçamento das escolas não fazia parte do orçamento do Instituto, dos mais baratos da Universidade. De fato, cada escola possuía rubrica própria no orçamento global do Instituto, um título do orçamento do Estado, exceto a Primária. Tal motivo poderia vincular-se aos custos da reforma do prédio, embora Azevedo as tenha financiado relativamente ao mobiliário, acervo de livros, materiais didáticos. Por outro lado, o Instituto captava recursos pela cobrança de taxas nos cursos superiores e na Escola Secundária. Desse modo, era difícil atribuir responsabilidades a um ou outro nível dado que se entrelaçavam de modo bastante peculiar. Contudo, afirmaram os professores que a separação do Instituto daquelas escolas não diminuíra o orçamento delas. Faz sentido tal afirmação pois o orçamento geral do Instituto em 1938 foi de 1.476:650$000; o orçamento da Escola Normal Modelo, para 1939, foi de 1:092:850$000. Outro dado é importante aqui. Em 1938 o IEUSP contava 61 funcionários e, em 1939, a Escola Normal Modelo 58; no caso dos professores, dos 69 existentes em 1938, passou-se a 42 em 1939. Nos dois casos os valores salariais permaneceram praticamente os mesmos.

Podemos concluir que o Instituto custava de fato caro dada sua megaestrutura, aparelhamento e reformulações pelas quais passou. Contudo tal acusação parece ter servido mais como meio de convencimento de uma platéia que, não dominando todos os elementos da contenda, não reunia condições para estabelecer a crítica ao procedimento discricionário do Estado. Em segundo lugar, as mudanças salariais foram operadas em relação aos cargos administrativos e professores e funcionários permaneceram como estavam. Excelente estratégia. Assegurou que os detentores de informações permanecessem na escola e a administrassem segundo as orientações do Secretário da Educação e Saúde Pública, Mariano de Oliveira Wendel, do campo católico, inimigo de Azevedo (TOLEDO, 1995).

Os gastos de Azevedo com a reforma - de um andar, segundo Barros -do prédio também foram utilizados. Sem contestar os valores dados como gastos, os professores optaram por detalhar, em sua defesa, o tipo de reforma que se realizara: “reconstrução dos dois primeiros pavimentos e de pavimento térreo (porão) da antiga escola normal, assim como a edificação de um terceiro pavimento sobre toda a área já construída, e a de um auditório (ainda por concluir-se), além da substituição integral das instalações de eletricidade, água, esgotos e gabinetes sanitários em todo o prédio” (ALMEIDA JR., 1966 a).

Tudo aprovado pelo governo. Mas os governantes já não eram os mesmos. Foi sob a Interventoria de Armando de Salles Oliveira, que a reforma iniciou, novembro de 1935 (Revista de Educação, dez. 1934; Archivos, 1937b). Em julho de 1936 o terceiro pavimento estava praticamente concluído, começando a construção do auditório e dois pavilhões laterais, trazendo ao Instituto a imponência e majestade que, antes, não tinha. Ademar de Barros finalizou as obras do prédio em proveito de seu projeto político e reconduziu a Escola Normal ao estatuto de instituição de alto nível.

As participações governamentais no processo de reconstrução do edifício da Praça da República foram unificadas, pelos docentes, como favoráveis à reforma. A posição de Castilho de Lima, primeiro governante envolvido, em 1933, era desfavorável, não explicitamente; a de Salles Oliveira era favorável por fazer parte de seus interesses e Melo Neto, reconhecendo a importância da obra, continuou seu financiamento. Mas o processo deflagrado contra o IEUSP o foi por Ademar de Barros e pelo Secretário do Estado dos Negócios da Educação e Saúde Pública, Mariano de Oliveira Wendel, cujas posições políticas eram diferentes das vigentes nos postos de poder do Instituto e articuladas, no plano nacional, com o Ministro da Educação Gustavo Capanema.[1]

É possível imaginar que uma reforma daquele porte não deve ter saído barato aos cofres públicos. De outro lado, não se pode desconsiderar que as construções portentosas marcaram o período. Pode ser mais razoável supor que se pretendeu estancar o crescimento do Instituto e sua ejeção a lugares acadêmicos e políticos, na cidade, no Estado e nacionalmente, pouco apreciáveis pelas forças contrárias. Azevedo não tratava apenas de viabilizar a formação do professor em nível universitário, mas de articular de tal modo os vários graus de ensino que o Instituto viesse a ser modelo para o funcionamento do sistema educativo. Várias iniciativas foram tomadas para ampliar seu público. O fato de que Almeida Jr. fosse Diretor de Ensino e que Azevedo fosse o Diretor do Instituto conferia maior poder de entrada na rede de ensino e influência junto aos professores. Funcionando o Instituto como um mini sistema de ensino reuniria condições de propor à rede um projeto pedagógico de caráter global.

O argumento do elevado preço das obras era motivo aparente para a intervenção realizada. Em maio de 1938, pouco antes do episódio, Azevedo informou ao Diretor Geral do Departamento Nacional, Mario de Brito, que as obras de construção do primeiro, segundo e terceiro piso estavam encerradas, faltando a parte final do “Auditorium, podendo fazer-se a inspeção federal permanente na Escola Secundária”. Por mais objeções que houvessem, as obras haviam chegado a bom termo e boa parte da escola já estava em pleno funcionamento. Tão bom funcionamento que, ao se extinguir o Instituto, a Escola Normal Modelo funcionou no mesmo prédio (Diário de S. Paulo, 11 de abril de 1939), e juntamente a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, cujo diretor era o católico Alexandre Corrêa, também inimigo histórico de Azevedo.[2]

Uma outra acusação relacionou-se à compra de mobiliário que, segundo o Interventor, chegara a oitenta contos de réis. No volume dois do livro Nota de Empenho, encontra-se uma despesa de 200:000$000, em 10 de junho de 1937, a ser paga para o Liceu de Artes e Ofícios pela confecção de mobiliário. No mesmo livro, volume 4, em 21 de março de 1938, consta uma despesa de 285:000$000 para os mesmos fins. Nos orçamentos de 1937 e 1938 vieram verbas de Material Permanente no valor de 200:000$000 e 300:000$000, respectivamente, o que permite supor que esses totais serviriam para pagar o Liceu. Os docentes informam que o mobiliário do Instituto seria substituído por outro a ser feito pelo Liceu de Artes e Ofícios cujos custos não excederiam a oitenta contos de réis.

Pontificava – entre as motivações construídas - a de que o Instituto prejudicava o combate ao analfabetismo por tornar difícil a formação dos professores primários. A resposta dos Catedráticos lançava mão de dados numéricos indicativos de que o Estado formava 1.600 professores por ano, sendo 800 as vagas existentes, para as quais se inscreviam cerca de 2.000 candidatos. Com estas evidências em punho, ironizaram: “Se procurar elevar o nível cultural do magistério primário significa ‘dificultar’ o ensino, deve também ser fechada a Faculdade de Medicina, que, com seu alto padrão de estudos, está ‘dificultando’ a cura dos doentes”( ALMEIDA JR., 1966a, p.212). Talvez a ironia não fosse a melhor saída já que, examinando os dados de matrículas, foi possível concluir que entre 1934 e 1936 o Instituto perdeu em torno de 310 alunos com o encerramento do Curso de Formação Profissional, correspondente ao antigo Curso Normal. Agregou, entre 35 e 38, apenas 53 alunos para o Curso de Formação de Professores Primários. Ou seja, ocorreu um estreitamento do atendimento à clientela. A existência de formados excedentes e desempregados não justificaria a elevação da formação do magistério primário ao nível superior. Também não a justificaria o argumento contrário.

Com relação a prejuízos aos docentes, o Interventor afirmou que como os Catedráticos pertenciam ao IEUSP, não ficariam prejudicados com a transferência para a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Não foi considerado, nesse caso, que a Escola Secundária possuía “Catedráticos” anteriormente aos do Instituto. Também na 5ª Seção do Colégio Universitário existiam Catedráticos, o que revelava desconhecimento ou que esse era mais um argumento de retórica...

Os Catedráticos da Escola Secundária não foram transferidos, mas as alterações produziram efeitos prejudiciais aos professores. Não mais partilhavam uma instituição universitária, além de, na prática, terem perdido a condição de escolas anexas que de algum modo lhes possibilitava a convivência com a produção do conhecimento, com professores estrangeiros, com conferencistas internacionais e com os Catedráticos do Instituto, além de perderem as relações estabelecidas entre os alunos dos cursos superiores e as escolas secundária, primária e infantil. Do ponto de vista dos Catedráticos e Assistentes transferidos para a FFCL ocorreu também grande perda. De unidade universitária, com procedimentos próprios de decisão política e acadêmica, assento no Conselho Universitário, relativa autonomia e vasto campo político de atuação, o IEUSP tornou-se Seção da FFCL, restringindo seu arco de influências, ao mesmo tempo que seus dois laboratórios mais importantes foram desarticulados, Psicologia e Biologia.[3] Praticamente tudo o que pertencia ao Instituto ficou na Escola Normal Modelo.

Outros argumentos vieram à baila: Fernando de Azevedo dirigia pessoalmente as escolas anexas ou nomeava sua direção. Afirmaram os Catedráticos que ele não as dirigia nem nomeava seus diretores, prerrogativa do Governo do Estado, exceto no caso da Escola Primária que após 1936 teve um Auxiliar assumindo as funções de direção. Os cargos que competiam a Azevedo nomear eram os de Inspetora e de Auxiliar de Inspetora do Jardim da Infância (Decreto nº.7.067, de 6 de abril de 1935). O Estado jamais utilizou sua prerrogativa para nomeação dos cargos de direção ou sequer foi contra as indicações de Azevedo, acatadas pela Congregação, em geral, por unanimidade. Não seguir a indicação de Azevedo criaria um fato político constrangedor, tanto para o Estado quanto para o Instituto.

Ademar de Barros chamou também como razão para o ocorrido a existência de Cadeiras vagas, indesejáveis em uma instituição universitária. Em resposta afirmou-se que tais Cadeiras estavam providas interinamente e os editais de concurso estavam abertos para a solução definitiva do problema. A informação do Interventor correspondeu a meia-verdade dado que existiam cadeiras vagas, porém não sem Catedráticos. A Congregação, a partir de setembro de 1935, realizou de inúmeros concursos para Catedráticos e Docentes-livres, realizando-se nesse ano três. Em 1936 e 1937 os concursos continuaram assim como em 1938 (Atas das sessões da Congregação, 1933-19...).

O quadro docente do Instituto estava praticamente completo. A primeira cadeira, Biologia Educacional, a segunda, Psicologia Educacional, a terceira, Sociologia Educacional, a quarta, Filosofia e História da Educação, a quinta, Estatística e Educação Comparada, e a oitava, Metodologia do Ensino Primário, estavam completas, com Catedráticos e Assistentes. Apenas duas encontravam-se em situação de interinidade, assumidas por Catedráticos de outras cadeiras. Mesmo que estivessem vagas, o que não ocorria, os outros cargos estavam preenchidos dentro das disposições legais, permitindo que os cursos funcionassem normalmente bem como as atividades laboratoriais, embora com dificuldades relativas a material. Tinham razão os docentes ao afirmarem que “é rara a escola superior em que esse fato não ocorre. E não se pensa, por isso, em suprimir a instituição”(ALMEIDA JR., 1966 a, p. 213).

A estrutura acadêmica do Instituto não se podia comparar com a de outras escolas superiores cujo corpo docente se constituiu ao longo dos anos, nem tampouco com a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras que contratara uma missão estrangeira para compor seu quadro de magistério. Pelo tempo que possuía de existência, pelas dificuldades que vinha enfrentando com as obras no edifício e considerando-se que só em 1935 conseguira implementar o currículo proposto, o IEUSP estava em estágio bastante avançado de organização. Tais determinações foram evidentemente ignoradas pelo Interventor, cujas ações não tinham em mente propiciar melhores condições de existência acadêmica para a instituição nem tampouco elevar a qualidade da formação do magistério, mas sim o seu extermínio por razões que progressivamente ficaram explicitadas.

Finalmente, o governo afirmou que os salários dos professores do Instituto eram os maiores da USP, superando os da Faculdade de Medicina. Demostrou-se objetivamente que os professores da Faculdade de Medicina recebiam mais. No IEUSP, um professor recebia 1:500$000 mensais para dar seis aulas por semana enquanto na maior parte da universidade este total subia para 2:300$000. No caso da Faculdade de Direito, para dar seis aulas um professor recebia 3:900$000. Para chegar a 3:000$000 mensais, o professor do Instituto deveria dar quinze aulas semanais. Na Faculdade de Medicina, o professor recebia 4:000$000 mensais pelo mesmo número de aulas. Mas se o salário do Instituto era menor que os acima referidos, era maior que os dos docentes da Faculdade de Farmácia e Odontologia, que chegava a 1:000$000 por mês (Decreto nº.6.414, de 25 de abril de 1934). Essa pendenga escondia os salários atribuídos aos professores da Escola Normal Modelo. Ali os Catedráticos recebiam 18:000$000, ao ano, por 18 aulas semanais, equivalentes aos salários dos Catedráticos do Instituto, com carga de ensino menor, mas com carga de pesquisa maior (Decreto nº.9.256, de 22 de junho de 1938).

Nem todos os argumentos de Barros estavam destituídos de objetividade. Contudo sua objetividade foi construída no terreno político e por isso pôde ser utilizada para o encerramento do Instituto. De todas as acusações, a única que incorreu em erro cabal foi a legal - a mais importante inclusive - já que o governador agiu ao arrepio da legislação em vigor, desconsiderando-a voluntariamente, porque assessorado pelo próprio Secretário da Educação.

Inconformados com o ocorrido, os signatários da carta procuraram estabelecer conversações com o governo do Estado para reverter o acontecido. Em julho de 1938, Azevedo escreve a Venâncio Filho relatando encontros entre Lima e Silva e o Secretário da Educação e com Ademar de Barros. Segundo ele, com o Secretário estava a camarilha que aprisionava o Interventor e que impediu fossem as decisões revistas. A única promessa de Barros fora encaminhar os decretos, já em vigência, ao Conselho Nacional de Educação para apreciá-los. Azevedo desabafou-se com Venâncio: “Ora, nada mais extravagante e grosseiro! Depois de calcada aos pés toda a legislação federal, de desrespeitados totalmente os Estatutos, de achincalhada a decisão federal que os aprovou, vão bater às portas do Conselho para pedir a sua aprovação.”(Azevedo apud PENNA, 1982, p. 124).

Em outubro, o jornal A Noite publicou o parecer do Conselho Nacional de Educação aprovando o parecer da Comissão de Legislação, cujo relator foi Aníbal Freire (ALMEIDA JR., 1966). Este parecer tratava da representação encaminhada por Fernando de Azevedo, Almeida Jr., Roldão Lopes de Barros e Milton da Silva Rodrigues contra os Decretos estaduais n°s 9.255 e 9.256, de 22.06.1938 e n°. 9.269, de 25.06.1938. Também respondia ao ofício do Interventor solicitando a apreciação, pelo CNE, da reforma realizada na USP. Freire realçou o atentado à pedagogia moderna e o procedimento ilegal do governo. Os decretos constituíam “flagrante e irretorquível infração dos dispositivos legais vigentes”, já que o Conselho Universitário deveria ter deliberado sobre o assunto, com 2/3 dos votos, sendo a decisão apenas sancionada pelo governo.[4] Representando o procedimento uma decisão ilegal, seródia e inválida, propunha o parecer a suspensão da execução do decreto estadual, devendo as decisões retomar o caminho previsto pela lei. Nada foi feito.

O desfecho dessa história deu-se com a aposentadoria compulsória de Fernando de Azevedo e Milton Rodrigues, em 1938, sob a alegação de desrespeito à Constituição de 1937 e subversão, ato de curta duração já que negociações entre Teixeira de Freitas e o General José Pinto, do Conselho de Segurança Nacional, suspenderam-nas (TOLEDO, 1995).

O Anuário da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP foi predestinado ao obituário: “Considerando que a preparação do magistério secundário é um dos objetivos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras” comunica-se que foi extinto o Instituto de Educação da USP (Anuário da Faculdade de Filosofia e Letras da USP - 1939/1949, v.I, 1953). Os despojos - seus catedráticos - foram transferidos para aquela Faculdade. Finalizou o cortejo fúnebre a criação da Seção de Educação - a quarta - no interior daquela unidade.[5]

 

Como se buscou explicar o episódio

 

As condições políticas e históricas em que esses acontecimentos se deram favoreceram o desaparecimento da temática na literatura histórica da área educacional. Duas obras - de Antunha (1974) e de Nadai (1991) - estudaram-na e construíram uma explicação para o ocorrido. Para Antunha (1974) a variante paulista de universidade, ao constituir uma unidade para os estudos desinteressados e outra para a formação pedagógica dos profissionais da educação, criou para os primeiros a FFCL e para a segunda incorporou o existente Instituto de Educação. Trouxera, assim, a estrutura híbrida que congregava escolas anexas e superior, dificultando a apropriação do mesmo estatuto das outras escolas superiores tradicionais, além do fato de que formar professores secundários não era socialmente reconhecido à época. Azevedo teria deixado um flanco aberto à crítica quando, ao elevar a formação do professor ao nível superior, admitiu uma primeira geração de professores nomeados sem concurso público e sem formação superior. Isto teria marcado o Instituto no seu nascimento levando a um “desprestígio inicial dos estudos educacionais”, agravado por seu caráter técnico.

É possível argumentar contrariamente. Inicialmente, três Catedráticos foram nomeados sem concurso, sendo os outros por concurso, com a presença do Conselho Universitário. Dos três nomeados, um era Azevedo, Bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas, outro era Almeida Jr., médico, e o terceiro, Roldão Lopes de Barros, normalista, como a maior parte do corpo docente do Instituto. Entretanto, a geração que assumiu a formação do professor em nível universitário publicava artigos em periódicos, livros, pesquisas, estudava no exterior, utilizava literatura estrangeira, especialmente americana e francesa, se submetia a concursos bastante exigentes e articulava-se às principais organizações acadêmicas do período. Talvez Antunha tenha incorrido no procedimento de tomar como critério de avaliação do Instituto o desprestígio da formação para o magistério no momento de sua pesquisa. No período em estudo - décadas de 20 e 30 - a Escola Normal da Praça era responsável pela formação de alto nível dos intelectuais da área educacional.

No tocante à formação técnica, na legislação há ênfase nesse aspecto, mas ele não correspondia à ausência de pesquisa e produção de conhecimento. Significava que a unidade formaria profissionais, técnicos. Nos escritos de Azevedo, por exemplo, a qualificação técnica estava lastreada na idéia de produção do saber, mesmo não se concedendo ao Instituto a prerrogativa de conferir o título de Doutor.

Com a instauração do Estado Novo, em 1937, e a proposição de seu modelo de universidade, a USP teria sido obrigada a promover adequações, especialmente com relação à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Respondendo à obrigação teria confirmado o desprestígio da área educacional, assimilando o Instituto à FFCL e retirando o “qualificativo educacional” de cadeiras como Estatística, Psicologia, Biologia e Sociologia.

Nadai atribuiu o encerramento das atividades do IEUSP à sua incapacidade de impor-se, dado que suas atribuições eram inversas àquelas presentes na sociedade. Para ela, “lutar contra gerações dele impregnadas (espírito bacharelesco), representava resistir à minimização ou mudança de qualquer proposta pedagógica que tivesse a intenção de modificar aquele status quo” (NADAI, 1991). Esta seria a explicação real, não aquela que vinculava o fechamento do Instituto às exigências de adequação da USP ao modelo da Faculdade Nacional de Filosofia. Proposto por Gustavo Capanema, então Ministro da Educação e Saúde Pública do governo Getúlio Vargas, tal modelo seria transformado em lei no ano de 1939, após, portanto, o fechamento do IEUSP, o que forneceu elementos para a autora afirmar que as razões técnicas apontadas - adequação ao modelo nacional - não se sustentavam.

Do arrazoado de Ademar de Barros não se colhem elementos para sustentar as hipóteses de Antunha e Nadai. Os motivos arrolados para o encerramento eram de natureza administrativa, embora só o fossem aparentemente. Nadai reconheceu que houve a interferência do interventor do Estado no sentido de atingir o grupo do jornal O Estado de S. Paulo, responsável pelo projeto da USP, do qual Azevedo era um dos expoentes. Sua atitude atingia diretamente a comunhão paulista, o que demonstraria o peso maior do fator político sobre o técnico, no episódio.

Tanto Nadai quanto Antunha sugerem a ausência de apoio interno a Azevedo. Conquanto se possa concordar com a assertiva em termos gerais, há que se perguntar quais motivos teriam levado a esse “desprestígio”. Cunha e Toledo fornecem pistas interessantes para a resposta. Cunha viu na criação da “Faculdade de Educação” e na FFCL a realização de “antigo projeto de Fernando de Azevedo para o ensino superior”, colocando para a primeira a tarefa de “formar o professor para o ensino secundário”, ficando com a segunda a dimensão de promoção da “cultura livre e desinteressada”(CUNHA, 1980, 239).[6] Esta configuração não impediu, no entanto, que “a força dos interesses dos professores das escolas profissionais, temerosos de perderem poder com a transferência de certas matérias para a nova faculdade, fizessem com que esta se transformasse em mais uma escola profissional, fundindo-se com a Faculdade de Educação na formação de professores para o ensino secundário” (Idem, p. 240).

Tais idéias colocam-se do outro lado da questão. Não explica propriamente o encerramento do Instituto, mas a transformação da FFCL em uma unidade de formação de professores secundários afastada de sua vocação original. De fato, a Congregação do Instituto, em dezembro de 1936, recebeu ofício, enviado pelo Secretário Geral da USP, Murillo Mendes, solicitando que discutissem projeto de reorganização dos cursos dos Institutos da universidade, tendo em vista a fusão de cadeiras, em número de 15, comuns à FFCL, pertencentes à Faculdade de Direito, de Farmácia e Odontologia, de Medicina Veterinária, de Ciências Econômicas e Comerciais e Escola Politécnica (Ata das Sessões da Congregação, 1933-19..). A Congregação aprovou unanimemente as mudanças sugeridas por entender que cumpriam a vocação da FFCL - preparação cultural, livre e desinteressada ou puramente científica - cabendo aos outros institutos um caráter exclusivamente profissional ou técnico. Como estas unidades eram minoria no Conselho Universitário, sua posição contrária às mudanças foi derrotada. Este pode ter sido um fator agravante já que a concepção da FFCL estava bastante ligada ao nome de Azevedo que, assumindo como sua a proposta, entendia a reorganização como economia, concentrando alunos, professores e cursos, otimizando espaços e recursos humanos e econômicos. As escolas atingidas lutaram contra a FFCL e suas ramificações no sistema universitário. Tal situação foi descrita como das mais difíceis em função da “resistência e hostilidade” à Faculdade mais visada pelas “escolas superiores de formação profissional”.

Toledo concluiu que o encerramento da experiência do IEUSP indicou a intenção do Estado, naquele momento, de “esvaziar e submeter os projetos que se diferenciavam da diretriz política” que vinha dando à educação(TOLEDO, 1995, p. 89). Teria, então, estrategicamente, utilizado o novo padrão de universidade - a Universidade do Brasil - para atingir politicamente seus adversários, já que estavam à frente da “emboscada” o Secretário da Educação e Saúde Pública de São Paulo, Mariano de Oliveira Wendel, e o diretor da FFCL, Alexandre Corrêa, ambos católicos e membros do grupo que fazia oposição à comunhão paulista, assumidos por Azevedo como seus inimigos confessos.

Se as determinações legais de Capanema não estavam editadas, estavam em curso, e o encerramento da Universidade do Distrito Federal e do IEUSP fizeram parte do mesmo processo político. Dois fatos merecem atenção. De um lado, o governo federal baixou uma portaria ministerial designando uma comissão para propor um plano para a Universidade do Brasil, datada de julho de 1935. Em setembro, nova portaria reorganizou a comissão.[7] O primeiro zoneamento proposto para a cidade universitária previu uma Escola de Educação e uma Escola de Filosofia, Ciências e Letras, ambas no Centro de Filosofia, Ciências e Letras e Educação (SOUZA CAMPOS, 1946). Em 1936, do primeiro projeto de construções continuavam constando a Faculdade de Educação e a de Filosofia. O próprio Projeto da Universidade do Brasil previa uma Faculdade Nacional de Educação e uma de Filosofia, Ciências e Letras (Lei n. 452, de 5 de julho de 1937).

O segundo fato refere-se à presença de Souza Campos na comissão acima referida, autor de inúmeras obras sobre ensino superior no Brasil e sobre a USP. Além disso, participou ativamente dos debates sobre o ensino superior nas décadas de 20 e 30. Tendo sido importante na criação da USP, foi indicado para escrever sua história, porém parece estranho que sua obra omita a unidade dedicada à educação naquela universidade. Em sua História da Universidade de São Paulo, de 1954, o IEUSP não é parte da história. Constituída em 1935, a comissão para tal contava com Azevedo e Souza Campos. Mais tarde, foi constituído o Escritório Técnico para construção da cidade universitária, sendo Souza Campos seu Diretor Geral. Em 1936, a unidade relativa à educação não constava mais dos planos de construção ((SCHWARTZMAN E OUTROS, 1984, Nota 40, p.96-97). Souza Campos também não se refere ao Instituto de Educação em seu livro Educação superior no Brasil, de 1940. Ao discutir a década de 20 apresentou as propostas sobre universidade e Faculdade de Educação mas, ao chegar nos anos 30, a Faculdade desapareceu. Não há referências ao IEUSP nem à Escola de Educação do Distrito Federal, criada por Anísio Teixeira. A obra referida, de 600 páginas, resultou de um discurso que iria proferir para os licenciandos da FFCL em 1938, isto é, para os egressos do IEUSP. Isto agrava o fato da omissão do Instituto, já que aqueles formandos só podiam estar se licenciando porque passaram pela formação pedagógica no IEUSP.[8] A conclusão a que se pode chegar é que acontecimentos políticos ocorridos entre 1936 e 1938 redefiniram a posição do governo federal e a estrutura de poder na área educacional, gerando repercussões no Estado que culminaram com o encerramento do IEUSP.

Ao rol das aludidas questões “administrativas” liga-se a influência de católicos nos rumos da política educacional do Estado Novo. Teve grande destaque nesse momento Alceu de Amoroso Lima, conselheiro do Ministro da Educação, Gustavo Capanema. A relação de confiança estabelecida entre os dois poderia ter levado ao fim do Instituto como mecanismo não apenas de retaliação política a Azevedo, mas como forma de subtrair-lhe o locus de onde poderia fazer difundir suas idéias de escola pública laica, entre outras. Azevedo ligava-se às forças contrárias a Barros e articulava um discurso que dificultava a inserção do ideário católico na formação dos professores. O fechamento do Instituto e a concomitante transferência de suas atribuições à FFCL, sob a direção de um católico, poderia garantir a difusão da moral cristã, como também um mercado que se afigurava fugidio diante da defesa da escola pública gratuita e laica.

Em 4 de abril de 1939 foi criada a Faculdade Nacional de Filosofia, pelo Decreto-lei n° 1190, modelo a ser seguido por todas as instituições do país. Para esta faculdade o Ministro indicou Amoroso Lima, que não aceitou. Mesmo não aceitando o cargo, a relação entre ambos era forte e pode ser compreendida no trecho que segue, retirado de uma carta escrita por Capanema a Amoroso Lima: “Tudo que combinei com você está na minha memória e nada deixará de ser cumprido. Nenhuma nomeação se fará sem o seu prévio assentimento”( Capanema apud (SCHWARTZMAN E OUTROS, 1984, p. 218). Este era o grau de influência da Igreja sobre o Estado, ou pelo menos sobre o Ministro da Educação. No entanto, nem sempre pôde o Ministro realizar as ordens de Amoroso Lima, a despeito de toda a vigilância que exerceu sobre ele, de tal modo que a Igreja acabou desistindo de dar a direção ideológica ao Ensino Superior, optando por criar sua própria universidade. Surge daí a primeira Pontifícia Universidade Católica, no Rio de Janeiro, em 1940.

O desenlace verificado no caso do IEUSP, assim como no da UDF, em que militantes católicos assumiram postos-chaves na USP e na direção da educação no Estado, permite pensarmos que a Igreja Católica desejava exercer sua influência também no interior do ensino superior público, já que detinha o monopólio do ensino secundário, embora de modo problemático. Olhava para o ensino superior de modo atento e nos anos 20 propôs como modelo desejável de universidade, para o Brasil, o católico (Inquérito..., 1929). Indícios importantes sobre esta possibilidade estão em uma carta de Fernando de Azevedo a Venâncio Filho, datada de 26 de junho de 1938. Assustado por não ter percebido as maquinações realizadas durante meses, demonstra toda sua ira contra o fechamento do IEUSP: A portaria, a secretaria, as bibliotecas, contínuos e serventes, com suas respectivas verbas de pessoal e de material, tudo foi retirado do Instituto e deixado com a Escola Normal Modelo. Tal procedimento se devera à camarilha desembestada, seus desafetos e inimigos rancorosos que acabaram ocupando os postos ligados à educação no Estado e na USP. Cita Alexandre Corrêa, que assumiu a direção da FFCL, Alvares Cruz, na direção do Departamento de Educação do Estado, e Francisco Azzi, na Direção Geral da Secretaria de Educação, todos militantes católicos, acusados de fascistas por Azevedo (Azevedo apud PENNA, 1987, p. 121).

Almeida Jr. relata o fato considerando Armando de Salles Oliveira clarividente quando incorporou o Instituto de Educação à USP. No entanto, “em certo dia de julho de 1938, inesperadamente trazem os jornais a notícia de que o governo estadual suprimira o Instituto de Educação. Seus professores universitários eram despachados para a Faculdade de Filosofia, onde iriam constituir a Seção de educação. O resto, isto é, os cursos de preparação e aplicação, permaneciam onde estavam, destinados a servir de suporte à futura Escola Caetano de Campos. [...] aniquilava-se a ambição de instituir-se em São Paulo um grande centro de investigações biológicas, psicológicas, sociais e estatísticas aplicadas aos diferentes ramos da Educação. Dava-se um passo para trás” (ALMEIDA JR., 1966, p. 231-2).

O relato de AZEVEDO é menos claro. O autor fala em linguagem cifrada, deixando vazar uma crítica à Igreja Católica de modo pouco explícito. Referindo-se às iniciativas dos renovadores em São Paulo, concluiu que “depois dessas e outras iniciativas, pareceu declinar, no Brasil, a campanha de renovação escolar que se vinha desenvolvendo com uma crescente intensidade havia mais de dez anos e que, como sabemos, veio à hora, caindo como um fruto maduro da árvore do espírito moderno e que, a seu turno, não cessou de dar frutos saborosos e amargos e muitas vezes contraditórios. [...] Nada se havia tentado, no terreno das realizações, para que esse movimento de conquista do espírito científico se fosse acentuando em nossa pedagogia, e penetrasse todo o ensino, provocando no ensino superior, como o mesmo espírito, as reformas que se empreenderam na educação fundamental e popular, confiada ainda exclusivamente aos Estados. [...] o ensino superior, de tipo profissional, velho de mais de um século, e o ensino secundário e humanístico, de tradições trisseculares, opunham pelas suas tradições intelectuais, uma resistência mais forte às inovações” (AZEVEDO, 1976, p. 184-7).

Sua análise coloca sobre as forças atrasadas a responsabilidade pelo impedimento da realização da universidade segundo os moldes científicos em que deveria vigorar. No entanto, não há referência direta à influência que exerceram sobre a decisão do governo estadual de extinguir o Instituto, além de não nominar tais forças. Há apenas uma passagem em que Azevedo refere-se ao assunto: “Essas duas universidades - a de São Paulo, cuja Faculdade de Educação (sem grifos no original) foi extinta em 1938 e na qual a Faculdade de Filosofia esteve a ponto de perecer à mingua de recursos (1938-1940) e a Universidade do Distrito Federal, absorvida em 1938 pela Universidade do Brasil - tiveram a sua evolução atropelada de dificuldades, em parte decorrentes da mentalidade utilitária e profissional, ainda dominante no sistema de ensino superior, e em parte resultantes do próprio “clima histórico” em que nasceram” (Idem, p. 188).

Finalmente, explica o declínio do movimento escolanovista - e possivelmente a extinção da UDF e do IEUSP - como resultado de lutas políticas que o colocavam sob a rubrica de ‘pensamentos perigosos’, ignorando a necessidade da investigação científica original em nosso país. Azevedo pareceu não se constranger em produzir uma explicação em que sobre ele recaísse a responsabilidade fosse pela vitória, fosse pela derrota. Outros elementos podem ser agregados, à guisa de exemplo, que o retiram do centro da cena política e compõem as determinações que geraram o episódio. Poder-se-ia pensar no caso de Lourenço Filho, que paulatinamente foi deixando clara sua identidade com o estado getulista e com a Igreja Católica. Alguns acontecimentos podem ser arrolados: seu apoio, em 1931, ao decreto federal que assegurava o ensino religioso facultativo nas escolas públicas; sua participação na abertura do Primeiro Congresso Católico de Educação, em São Paulo; sua presença no escritório do plano da Universidade do Brasil, juntamente com os católicos Leitão da Cunha e Souza Campos, entre outros fatos – que culminaram com sua presença na direção do INEP, em 1938.[9]

                O raciocínio até aqui desenvolvido procurou reconstruir as razões que levaram ao aniquilamento, no Brasil, de uma proposta de formação do magistério que não só a elevava ao nível universitário como também a ela atribuía as capacidades para a produção do conhecimento. Aliava-se a tal proposição a defesa inconteste do dever do Estado para com a educação pública. Interesses que, de um modo ou outro, colidiram tanto com os da Igreja quanto com os do governo getulista.

            Uma terceira questão que me chamou a atenção diz respeito ao procedimento do Interventor Federal Ademar de Barros que não conseguiu elencar, entre seus argumentos para a extinção do Instituto, nenhum que fosse objetivo e expressasse de fato um problema a ser solucionado por essa via. A única razão pedagógica apresentada tinha um caráter pífio, ou seja, o Interventor aludiu ao fato de que o Instituto estava dificultando a formação do professor por tê-la posto no nível universitário. Evidentemente não se tratava de reduzi-la ao nível secundário - como de fato foi feito -, mas de acabar com a possibilidade de constituir o magistério a partir de marcos referenciais científicos e distante da tutela católica.

A elevação dessa formação ao nível superior tinha um sentido de qualificação profissional e de formação científica de alto nível. Também o fato de que professores da rede de ensino podiam matricular-se nos cursos de Aperfeiçoamento e de Administrador Escolar recebendo, para isso, uma bolsa de estudos era uma outra solução importante para a formação do magistério, que depois de anos de prática podia retornar à Universidade para novos estudos.

A atitude do Interventor Federal revelou sua capacidade de lidar com as questões educacionais e sua incapacidade cultural de dimensionar o projeto de formação do professor que então se desenhava. Não se trata de lamentar que a história tenha sido assim e não de outro modo, mas o que constitui e institucionaliza um projeto educativo e não outro é a consciência civilizatória que aqueles que detêm o poder de determiná-los e escolhê-los possuem. Ao que tudo indica o Interventor Federal e aqueles que o apoiaram em suas atitudes partilharam da construção de argumentos obscuros, impedindo que as razões para o encerramento do IEUSP fossem conhecidas.

Este episódio, violento primeiro contra a formação docente e depois contra a Universidade, parece ter ocorrido com tranquilidade. É particularmente de difícil compreensão a posição alheia do jornal O Estado de S.Paulo já que de Júlio Mesquita Filho, Salles Almeida e Fernando de Azevedo havia partido a iniciativa da redação do decreto que criou a USP; ademais Azevedo tinha sido o redator dos Estatutos da Universidade. Em seus escritos Azevedo não faz qualquer referência às posições defendidas pelo jornal. Considerando que o episódio foi denunciado e publicado nos jornais do Rio de Janeiro, é possível concluir que envolvimentos políticos entre a “comunhão paulista” e o Interventor Federal vinham ocorrendo naquele momento. Quais relações e qual seu peso no encerramento do IEUSP é um problema a ser verificado.

Em outra parte dessa história restam pontos a serem discutidos. Entre eles ressalta o modo pelo qual Azevedo elidiu, em seus escritos, informações concretas sobre a instituição que fundou e dirigiu e que, por hipótese, poderia auxiliar os mestres da contemporaneidade a mais bem conhecer sua trajetória acadêmica, científica, profissional e política.

 

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* Professora do Departamento de Estudos Especializados em Educação, Centro de Ciências da Educação, Universidade Federal de Santa Catarina. Doutora em História e Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Endereço: Travessa Jasmim dos Poetas, 85.  88.630-110 – Praia do Campeche, Florianópolis – SC. E-mail: olinda@brasilnet.net.

 

[1] Ademar Pereira de Barros foi Interventor Federal entre 26 de abril de 1938 e 10 de novembro de 1939. Depois de breve interregno, assumiu de 26 de novembro de 1939 a 5 de junho de 1941. VARGAS, 1995.

[2] Quando o Manifesto foi lançado, Corrêa teceu críticas veementes contra ele. Azevedo, em carta a Venâncio Filho, retrucou que “o artigo que o Alexandre Correa, um outro católico, apostólico, romano, de um sectarismo fanático, deixou sobre a mesa d’Estado, é uma peça inepta e grosseira, que se afina, com a de Tristão, pela sua nota de agressividade”. Azevedo apud PENNA, 1987.

[3] No mapa das faltas e comparecimentos de junho de 1938 havia a seguinte observação: “Todos os funcionários do Laboratório de Psicologia estiveram freqüentes até o dia 22, data do Decreto nº.9.255, de 22 de junho de 1938, que transferiu para o Departamento de Educação o mesmo Laboratório”. Boletim de freqüência. 1938. O referido decreto reorganizou a Diretoria de Ensino, transformando-a em Departamento de Educação. O Laboratório de Psicologia ficou, então, subordinado à Diretoria do Serviço de Orientação Pedagógica, órgão daquele Departamento, inclusive o pessoal, o material e as verbas consignadas em orçamento.

[4] Aníbal Freire refere-se ao artigo 14 do Decreto federal n°. 24.279, de 22.05.1934, que rezava: “Em qualquer universidade estadual equiparada, as modificações em seus estatutos, que obedecerão à legislação em vigor, só poderão ser efetivadas por proposta do Conselho Universitário e sanção do respectivo Governo, devendo ser ouvido o Conselho Nacional de Educação. E ao inciso V, do artigo 11, do mesmo decreto: Deliberar sobre modificações nos Estatutos da Universidade, a vigência das quais dependerá do voto de dois terços da totalidade dos membros do Conselho e da aprovação dos poderes superiores”.

[5] Alexandre Corrêa foi indicado para a direção da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; Alvares Cruz, para a do Departamento de Educação do Estado de São Paulo; Francisco Azzi, Diretor Geral da Secretaria de Educação (TOLEDO, 1995).

[6]A denominação Faculdade de Educação foi dada pelo autor a partir do uso feito por Azevedo, embora o nome oficial seja Instituto de Educação. Por outro lado, no organograma do IEUSP fica clara sua atribuição de formar professores para todos os graus do ensino, excluído o superior.

[7] Compunham a comissão Raul Leitão da Cunha, Juvenil da Rocha Vaz, Filadelfo de Azevedo, Inácio M. Azevedo do Amaral, Carneiro Felipe, Ernesto de Souza Campos, Coronel Newton Cavalcânti, Lourenço Filho, Antônio de Sá Pereira, José Flexa Ribeiro, Jônatas Serrano, Roquete Pinto, Luís Cantanhede de Carvalho Almeida e Paulo Everard Nunes Pires. Relatório do extinto escritório de plano da universidade do Brasil. 1944.

[8] Atividades do extinto escritório do plano da universidade do Brasil. Relatório apresentado ao Ex.mo. Sr. Ministro da Educação e Saúde, dr. Gustavo Capanema, abrangendo o período de 1935 a 1944. 1946. Foi organizado um primeiro esboço que contemplou um Centro de Filosofia, Ciências e Letras e de Educação. Nele estavam a Escola de Filosofia, Ciências e Letras e a Escola de Educação, além de um Instituto de Psicologia Experimental e um de Fonética (Atividades..., 1946, p.10) . Os estudos e programas apresentados pelo Escritório da Universidade do Brasil, em 1937, trouxeram a proposta de construção de um prédio para a Faculdade de Educação e de um para a Faculdade de Filosofia e suas variantes ( Atividades..., 1946, p.27). Ao que tudo indica, no início do mês de junho de 1939 ainda estava mantida a constituição das duas faculdades ou escolas - Educação e Filosofia, Ciências e Letras. Contudo, no decorrer do mês, ocorreram ajustamentos nos programas propostos pelo Escritório referentes às Escolas de Filosofia, Ciências e Letras, e de Educação e Ciências Sociais, Políticas e Econômicas, assim como para a Escola de Educação Física, criada pelo Decreto-lei n° 1.212, de 17 de abril de 1939. (Atividades..., 1946, p.34).

[9] De 17 a 25 de outubro de 1931, o Centro Dom Vital de São Paulo realizou na Cúria Metropolitana o 1º Congresso de Educação. Lourenço Filho, “leal e inteligente”, esteve na sessão inaugural e recebeu uma “Moção de Louvor” pelo decreto do ensino religioso facultativo. (A Ordem, 1931). Em carta dirigida a Frota Pessoa, Fernando de Azevedo refere-se ao Congresso Católico e à moção de aplauso a Lourenço Filho. Azevedo assim se expressou: “Não compreendo. Mas, como o Sr., lamento profundamente essa atitude que trairia aos interesses da educação. A laicidade da escola pública é uma conquista moderna, que consulta os próprios interesses da religião. Não querem, porém, compreendê-lo aqueles que dirigem esse movimento de reivindicações religiosas, reabrindo para questão que, no interesse geral, já estava inteiramente liquidada” (Azevedo apud PENNA, 1982, p.145-6).