SOCIEDADE,
POLÍTICA E EDUCAÇÃO NA OBRA DE THOMAS HOBBES
Clóvis Lopes
Júnior[1]
Maria Rosemary Coimbra Campos Sheen*
Thomas Hobbes filósofo inglês (1588 – 1679), foi um dos mais
importantes pensadores do século XVII, pois além de se preocupar em responder
às necessidades do seu período histórico, seu pensamento exerceu grandes
influências nos séculos seguintes e até hoje exerce, orientando a prática
política realizada na sociedade.
Suas obras buscaram responder questões do mundo histórico em que
ele viveu, e neste sentido a contextualização do seu pensamento é necessária
para uma compreensão que nos propicie seu estudo para além de suas idéias e sua
filosofia. Enfim, tratar a filosofia como um pensamento histórico. Existe nos
escritos do autor toda uma vinculação entre a Filosofia Política, o Estado, o
Poder, a própria forma de compreender o homem e a educação.
Dentre suas obras, no exílio em Paris, publicou, em 1642, o texto Sobre o Cidadão, o mesmo período em que
na Inglaterra se desencadeou a guerra civil. De volta à Inglaterra, em 1650,
sem se desviar dos interesses sociais, publicou mais duas obras: Natureza Humana e Sobre o Corpo Político.
Sua obra mais conhecida, Leviatã
ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil, publicada em
Londres, em 1651, traz uma continuidade de estudos e defesas que a vinculam às
obras anteriores, mais ainda, nela está contida todo o pensamento do autor,
visto que, os seu demais escritos são uma preparação para esta grande obra. Seu
pensamento está dirigido para a discussão sobre a melhor forma de se constituir
um Estado que atenda às necessidades emergentes do seu tempo. Thomas Hobbes se
preocupou com os fundamentos desse Estado. Para a sua ordenação é dirigida a
filosofia política do autor.
No estudo desses fundamentos Thomas Hobbes estuda a natureza do
homem e afirma que todos são dotados de iguais potencialidades, e tudo aquilo
que o homem conseguir por meio dessas será seu de direito. Esta consideração
está presente no capítulo XIII do Leviatã, “Da condição natural da humanidade
relativamente à sua felicidade e miséria”, e nele o autor encontra o elemento
fundamental para propor a formação do Estado como força maior para o
estabelecimento da ordem e da paz. Thomas Hobbes faz referência à igualdade da
natureza humana, levada às suas últimas conseqüências. Segundo ele, a discórdia
ocorre quando dois homens se interessam por uma mesma coisa, impossível de ser
adquirida por ambos ao mesmo tempo, levando-os à destruição, seja pela busca de
sua própria conservação ou simplesmente pelo desfrute do prazer. Desta forma o
autor destaca três causas principais que provocam a discórdia entre os homens:
a competição, a desconfiança e a glória.
A primeira leva os
homens a atacar os outros tendo em vista o lucro; a segunda, a segurança; e a
terceira, a reputação. Os primeiros usam a violência para se tornarem senhores
das pessoas, mulheres, filhos e rebanhos dos outros homens; os segundos, para
defendê-los; e os terceiros por ninharias, como uma palavra, um sorriso, uma
diferença de opinião, e qualquer outro sinal de desprezo, quer seja diretamente
dirigido a suas pessoas, quer indiretamente a seus parentes, seus amigos, sua
nação, sua profissão ou seu nome. (Hobbes, 1983, p. 75)
Hobbes partindo de uma concepção de homem como sendo por natureza
egoísta, desenvolve em sua obra uma minuciosa teorização e defesa do
absolutismo. Partindo desse pressuposto, torna-se claro que a única forma de
manter os homens em respeito, evitando uma guerra civil seria a instauração de
um poder forte e centralizado. Para Hobbes esse processo deveria ser
realizado por meio de um pacto social
entre os homens, os quais abdicariam dos direitos que seriam inerente a sua
natureza transferindo-os para um representante encarregado de promover a paz.
Muito embora a origem do Estado resulte do estabelecimento de um contrato
social, a sua efetivação, de acordo com o autor, não se deu sem conflitos. Por
isso, para que esse Estado fosse aceito, os homens precisavam ser educados para
a obediência civil.
[...] Se desaparecesse este temos supersticioso
dos espíritos, e com ele os prognósticos tirados dos sonhos, as falsas
profecias, e muitas outras coisas dele decorrentes, graças às quais pessoas
ambiciosas e astutas abusam da credulidade da gente simples, os homens estariam
mais bem preparados do que agora para a obediência civil. [...]
E esta devia ser a tarefa das Escolas, mas elas
pelo contrário alimentam tal doutrina. (Hobbes, 1983, p. 14)
Desta forma, embora Hobbes não seja um autor que tenha merecido
destaque nas páginas dos livros de história da educação, é inegável que sua
obra teve esse caráter educador do “homem novo”, produto da sociedade
capitalista.
Thomas Hobbes sabia que a luta que estava a enfrentar não era uma
luta de pequeno porte. Sua convivência com Bacon (1561 – 1626) de quem foi
secretário entre 1621 a 1626, sua leitura de Descarte (1596 – 1650) – com quem
travou debate e até mesmo fez algumas objeções às suas meditações - e outros
homens da Ciência e da Filosofia influenciaram o seu pensamento, do qual
encontramos importante ressonância na ciência e na prática política da
atualidade.
Por isso consideramos importante a realização de um estudo que
procura aprofundar o pensamento desse autor, ressaltando especialmente sua
forma de conceber a educação no limiar da sociedade burguesa.
A obra de um escritor
do porte de Thomas Hobbes não é um trabalho descolado das questões de sua
época. Entendemos que a prática social na gênese da sociedade moderna orienta e
norteia os estudos do autor no exato sentido em que a consciência é sempre uma
expressão de uma forma histórica dos homens.
Desta forma o estudo de
suas reflexões pode nos ajudar a entender não só como ele buscou, pela teoria,
por movimento na prática social, mas compreender as próprias questões que sua
época o motivou a escrever.
Na análise da Filosofia
Política de Hobbes o problema que o presente projeto de estudo levanta é a
compreensão do egoísmo como forma de ser do homem na sociedade que está a
nascer e o papel social da educação por ele proposta a partir desta
conceituação. O problema em questão não se resume apenas em entender qual a
educação proposta pelo autor diante de um período histórico que assistia a uma
guerra civil no seu país, mas tentar compreender os recursos que o autor se
utilizou para convencer os homens de sua época a estabelecerem a instauração de
um novo Estado que garantisse a vida dos homens com acumulação individual mas,
com ordem e paz para a humanidade.
Hobbes não vê a
educação do homem que ele almeja na prática social sendo realizada apenas pela
soberania da razão que entendia não suficiente diante dos interesses
particulares das pessoas. A defesa desses próprios interesses o leva na sua
obra a defender a educação como forma de colocar ordem e paz na sociedade dirigida
pelo poder político do rei. Neste sentido o estudo da educação no pensamento do
autor nos ajuda a compreender o próprio papel que ele assume na luta que estava
sendo travada na Inglaterra na gênese do capitalismo.
Ao nos propormos estudar o pensamento de Thomas Hobbes num curso de
mestrado na área de Fundamentos da Educação não o fazemos por concordarmos ou
discordarmos de suas idéias. O que nos move a este estudo antes de qualquer
outra coisa é a tentativa de compreender num momento significativo da vida dos
homens, ou seja, nos primórdios da sociedade capitalista, todo um esforço não
só no campo econômico, mas no terreno da Filosofia para por movimento na
história. Totalidade e contradição marcam no terreno do método nossa
compreensão da história e da filosofia e correspondentemente das defesas feitas
pelo autor, inclusive, a da educação que emana de sua obra.
Thomas Hobbes participou e se comprometeu com as lutas sociais de
sua época. Neste sentido, dentre as categorias de análise que orientam a
pesquisa, destacamos ainda a explicação filosófica do homem na obra do autor
como um conceito que nasce na história e que nos ensina que o que somos e o que
fazemos coincide com a forma de existirmos.
Ao mesmo tempo tentamos não perder uma compreensão da história que
se faz dialeticamente como contradição em processo. As condições objetivadas na
vida material impõem, numa dada qualidade de sua produção, novas necessidades
ao fazer e ao pensar dos homens. Nesse processo defendemos, pela análise histórica,
que o movimento no qual os homens e seus pensamentos ganham forma e
significado, não só entram em contradição com a forma precedente de vida mas só
podem ser alcançado no seu significado pela consciência da totalidade. O que
nos leva a defender que o método de pesquisa na educação é um movimento que vai
do objeto singular, no nosso caso a filosofia de Thomas Hobbes, à uma
totalidade maior que explica em seu significado histórico: a defesa do Estado.
Portanto, o estudo deverá ser realizado vinculando a filosofia política do
autor com o momento histórico em que ele viveu.
REFERÊNCIAS
HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, Forma e poder de um Estado
eclesiástico e civil. São Paulo: Abril Cultural, 1984. Coleção os Pensadores.
HOBSBAWM, Eric J. Sobre história. São Paulo: Companhia das Letras,
1998.
MACPHERSON, C. B. Teoria política do individualismo possessivo de
Hobbes até Locke. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
ANGOULVENT, Anne-Laure. Hobbes e a moral política. Papirus, s/d
TUCK, Richard. Hobbes. Edições Loyola
STONE, Lawrence.
Causas da Revolução Inglesa 1529-1642 / Lawrence Stone; tradução Modesto
Florenzano. Bauru, SP: EDUSC, 2000.
HOBBES, Thomas.
Behemoth ou o Longo Parlamento. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001
HILL, Christopher. A
Revolução Inglesa de 1640. Editorial Presença. 3ª. edição