UMA TRAJETÓRIA INQUIETA EM BUSCA DE UM NOVO EDUCADOR

REFLEXÕES SOBRE AS MUDANÇAS CURRICULARES DO CURSO DE PEDAGOGIA DO UNISAL – AMERICANA

 

Helly Flávia Pirró Fenley

UNISAL - Americana

 

I – Os Salesianos no Brasil

                        O Centro Universitário Salesiano é mantido por religiosos pertencentes à Congregação Salesiana, fundada por Dom Bosco e mais quatro jovens. Na biografia de Dom Bosco, escrita por Terésio Bosco, encontramos o seguinte trecho:

      Reunimo-nos no quarto de Dom Bosco, Roquiet, Artiglia, Carbiero e Juan. Foi-nos proposto fazer, com o auxílio do Senhor e de São Francisco de Sales, uma prova de exercício prático de caridade para com o próximo. A seguir faremos uma promessa, depois, se possível, faremos um voto ao Senhor. Aos que fazem esta prova e aos que fizerem mais tarde, deu-se o nome de Salesianos. 1

Isto ocorreu em 26 de janeiro de 1854, em Turim. Muitos religiosos pediam a Dom Bosco que explicasse como era o seu sistema de educação. Esquematizado por ele mesmo, fazia uma diferença entre o sistema repressivo e o sistema preventivo para os jovens que eram o objetivo de todo o seu trabalho. Dom Bosco considerava:

...sistema repressivo (usado no Estado, no Exército) o que consiste em fazer com que a lei seja conhecida pelos súditos; depois velas a fim de conhecer os transgressores e puni-los. Neste sistema, as palavras devem ser severas; o superior deve evitar toda familiaridade com os dependentes, achar-se mui de raro no meio daqueles que lhe estão sujeitos. No sistema preventivo (que ele quer usado nas suas obras)... apoia-se todo inteiro na razão, na religião e na cordialidade. Exclui, por isso, todo castigo violento, e procura evitar até as punições leves. 2

                   Todo trabalho preventivo estava apoiado na razão, na religião e na “amorevoleza”, esta, muitas vezes, traduzida como cordialidade, amor, carinho e caridade. Este tripé é a base de todo o currículo. Para ele, o educador era um indivíduo consagrado ao bem de seus alunos, por isso estaria sempre pronto a todo e qualquer incômodo, a enfrentar canseira para conseguir o fim em vista: a formação cívica, moral e científica de seus alunos.

                   Nos oratórios, nos quais ele recolhia crianças e jovens, Dom Bosco dava-lhes educação e ensinava-lhes ofícios. Tinham liberdade para correr, para pular; tinham exercícios desportivos, música, teatro, passeios e havia muita compreensão e diálogo.

                   Lourenço Filho considera Dom Bosco como real percursor da escola nova.

... São João Bosco, o qual pôs em ação uma pedagogia tendente a prevenir desequilíbrios sociais que começavam. Não deixou obra sistematizada escrita, havendo, no entanto, fundado uma grande obra prática que continua a florescer em escolas de trabalho da ordem religiosa, que fundou, a dos Salesianos. Muitas de suas observações, sobre o desajustamento de crianças e jovens, vieram a ser inteiramente confirmadas por estudos objetivos da psicologia. 3

                   A obra salesiana na América do Sul desenvolveu-se inicialmente na Argentina e, em seguida, expandiu-se pelo Uruguai. Em 1885, foi fundado o Liceu Coração de Jesus, em SP. O ginásio de São Joaquim, em Lorena, também no estado de São Paulo, foi fundado em 1890. Em Cachoeira do Campo foi fundada a escola Dom Bosco, em 1895. Em Campinas, foram fundados o Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, em 1897 e o Externato São João, em 1910. Muitas outras obras foram criadas em vários outros estados brasileiros.

                   O início da obra Salesiana, em Americana, aconteceu em 16 de outubro  de 1949 e começou com o oratório. Era um edifício simples e bastante distanciado do centro da cidade que era muito pequena. A inauguração do primeiro prédio deu-se no dia 26 de novembro de 1950, prédio que já não existe mais porque deu lugar ao que hoje é a quadra de esportes e salas onde funcionam os cursos de pós-graduação. O dia 20 de fevereiro de 1951 foi o primeiro dia letivo do curso primário que se iniciou com trinta e três alunos. Mais tarde, em 1965, começou o curso ginasial, e foi construído o prédio frontal, sito à rua Dom Bosco. Os cursos que eram mantidos por essa entidade eram gratuitos e havia um convênio com a Prefeitura Municipal de Americana, que os subsidiava. Em 13 de junho de 1972, foi autorizado pelo MEC (Ministério da Educação e Cultura) o funcionamento do Instituto de Ciências Sociais de Americana com os cursos, de nível superior, de Pedagogia, de Administração de Empresas e Serviço Social. O primeiro vestibular foi realizado em 25 de julho de 1972 e o início das aulas no segundo semestre. A primeira turma freqüentou os dois semestres sem férias e, em março de 1973, iniciou o segundo ano do curso. Em 1981, começaram os cursos de pós-graduação. Mais tarde, novos cursos são aprovados: o de Processamento de Dados, em 1987 e o de Engenharia Elétrica, em 1992. Em 25 de fevereiro de 1993, o Instituto de Ciências Sociais de Americana passa às Faculdades Salesianas e os cursos passam a ser mantidos pelo Liceu Coração de Jesus com sede em São Paulo.

                   No final de 1997, é aprovada a criação do Centro Universitário Salesiano, agora com sede em Americana. Na unidade de Americana, em 1998, começaram a funcionar os novos cursos superiores de Propaganda e Publicidade, Turismo e Ciências Contábeis.

           

II – O Curso de Pedagogia e a Nova Proposta Curricular

 

As grandes transformações no mercado de trabalho, exigindo profissionais competentes, criativos e críticos, exigiram também professores capazes de trabalhar o desenvolvimento desse perfil profissional. Para que isso seja possível é necessário que o professor vá além do discurso teórico e estabeleça uma relação com o seu cotidiano.

                   Formar professores com estas características, capazes de refletir sobre a sua ação educativa e o processo educacional do qual eles fazem parte, é uma das grandes metas do curso de Pedagogia. A preocupação com a formação do professor capaz de fazer a leitura do mundo, interpretá-lo, nos levou a refletir sobre o curso. Assim, essas discussões começaram no Departamento de Pedagogia nas reuniões mensais, o que facilitou muito a nossa compreensão da necessidade de questionar não só o curso, como também fazer novas propostas. Chegamos, então, à conclusão, de que precisávamos nos aprofundar mais sobre as questões levantadas. Elegemos, dentre nós, uma comissão que trabalhou durante quase três anos neste estudo. Este grupo de professores reunia-se, semanalmente, numa das salas do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas, porque a maioria deles residia em Campinas. Foram reuniões de debates, reflexões, estudos e de oportunidade de ouvir experiências de professores de outros Cursos de Pedagogia.

                   À medida em que as discussões do grupo iam transcorrendo, elas eram levadas ao departamento, para não só serem divulgadas, mas também  para serem questionadas, em um trabalho coletivo. A construção dessa proposta foi fruto de debates, nos quais também alunos participaram. O envolvimento de alunos se deu em reuniões na Semana de Estudos para o Projeto Pedagógico, em que foram sugeridos temas que, discutidos em grupos pequenos, foram depois a plenário. Esta discussão levantou, da parte desses alunos, questionamentos sobre o curso, com críticas e sugestões.

                   Da participação dos alunos, professores e dos estudos da comissão de currículo surgiu a proposta de mudança do Curso de Pedagogia. Com o projeto pedagógico concluído em 18 de novembro de 1994 e aprovado em reunião do Departamento de Pedagogia em 07 de dezembro de 1994, a etapa seguinte foi elaborar a proposta de alteração do Curso de Pedagogia. Em 21 de setembro de 1995 esta proposta foi aprovada pelo Departamento de Pedagogia. No mesmo mês, foi aprovada pelo Conselho Departamental da Unidade de Americana e, em seguida, pelo CEPE – Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão das Faculdades Salesianas.

                   O novo currículo propunha como principais alterações a introdução das disciplinas Pesquisa Aplicada à Educação, Introdução à Pedagogia, Reorganização do Estágio e Reestruturação do curso em quatro anos.

                   Essas alterações foram assim definidas:

                   Pesquisa Aplicada à Educação – Distribuída no currículo sob a forma de iniciação, desenvolvimento e conclusão (com o Trabalho de Conclusão de Curso – TCC). Esta disciplina será portadora de três objetivos simultâneos: (i) Permitir que o aluno tome a iniciativa de buscar novas informações, garantindo, para tanto, as condições mínimas necessárias de tempo (reservado na organização da grade curricular), recursos humanos (orientação dos professores) e materiais (utilização das salas e da biblioteca); (ii) consolidar no aluno a capacidade de buscar as informações em diferentes  fontes e incorporá-las a uma proposta de pesquisa, preparando-o, assim, para uma postura intelectual fundada na observação contínua e crítica; (iii) motivar o aluno com o desenvolvimento de um trabalho onde ele perceba o processo como um todo, finalizando com o TCC.

                   Introdução à Pedagogia e ampliação das habilitações – Objetiva formar um pedagogo com visão mais completa de sua prática profissional. A disciplina Introdução à Pedagogia cumprirá a tarefa de orientar e estimular o aluno, apresentando-lhe o estrutura do curso e as possibilidades de atuação profissional, enquanto as habilitações vêm ampliar sua formação, capacitando-o para diferentes tarefas que venha a desenvolver profissionalmente, enquanto pedagogo.

                   Reorganização do estágio – Para que, articulado às disciplinas Pesquisa Aplicada à Educação e Prática de Ensino, oriente o processo de aproximação do aluno com o universo de sua futura prática profissional. Esta orientação, estruturada ao longo do curso, visa permitir ao aluno uma análise criticamente elaborada daquele universo.

                   Reestruturação do curso em quatro anos – Considerando as novas propostas e a necessidade da atendê-las com qualidade, torna-se fundamental um tempo maior, dedicado à formação do aluno.

                   As  disciplinas do curso foram organizadas em três eixos: a formação de um profissional “interrogativo” em relação à realidade; a formação mais ampla; e um profissional que possa atuar e intervir nesta realidade norteado por análises mais maduras da mesma.

                   Serão os três eixos acima mencionados que, pensados como complementares, irão dar ao aluno uma formação menos fragmentada, que privilegia a autonomia e a construção (ao invés da repetição) do conhecimento e que será norteadora de uma prática profissional realmente embasada pela criticidade , ou seja, pela “desconfiança” permanente de suas próprias atitudes.

 

1.º EIXO: A FORMAÇÃO “INTERROGATIVA”

                   O primeiro eixo está alicerçado nas disciplinas voltadas para a pesquisa, desde a sua iniciação no primeiro ano, até o seu término, com o Trabalho de Conclusão do Curso.

                   As matérias voltadas para a pesquisa não têm como objetivo formar o pesquisador “strictu-sensu”, mas objetivar no aluno (e no futuro  profissional) a possibilidade de: problematizar a realidade; refletir sobre eles; elaborar  perguntas pertinentes e saber as respostas articulando leituras e dados na realidade.

 

2.º EIXO: UMA FORMAÇÃO MAIS AMPLA

                   O segundo eixo está concentrado nas disciplinas: Introdução à Pedagogia e naquelas voltadas para as habilitações específicas.

                   Caberá à Introdução à Pedagogia orientar o aluno quanto à estrutura do curso que ele está iniciando e apresentar-lhe os campos de atuação do pedagogo, trabalhando questões importantes sobre a educação. Justifica-se esta disciplina pelo desconhecimento da realidade educacional brasileira, embora alguns já exerçam o magistério.

                   Para que o aluno tenha uma visão mais ampla (e completa) das áreas específicas de atuação do pedagogo, serão colocadas todas as disciplinas  voltadas para o exercício profissional especializado (as habilitações). Ao privilegiar a inserção deste conjunto de disciplinas durante o curso, acreditamos estar proporcionando  ao aluno uma formação específica e, ao mesmo tempo, articulada com o conjunto das áreas de atuação profissional e com as disciplinas de formação geral.

                   A diferença entre esta postura (um curso que contempla todas as habilitações) e a mais comumente utilizada nos cursos de Pedagogia (apenas algumas habilitações são contempladas durante o curso) vai ao encontro das novas necessidades profissionais.

 

3.º EIXO: A FORMAÇÃO PROFISSIONAL

                   Este eixo organiza-se, principalmente, através do estágio Supervisionado e das disciplinas Prática e Metodologias de Ensino.

                   Para cumprir o papel de orientar o aluno na sua inserção gradual ao universo de trabalho futuro, o Estágio será estruturado para acompanhá-lo desde o segundo ano, articulando-se com a disciplina de Prática de Ensino e com as cinco áreas de Metodologias de Ensino, além das disciplinas voltadas para as habilitações específicas.

                   O estágio pode, ainda, cumprir o papel de permitir ao aluno a coleta de dados para a pesquisa que vem sendo desenvolvida.

 

III – A disciplina de Pesquisa Aplicada à Educação

 

- O que pensam os professores e alunos

 

                        Em 1999, já tínhamos uma primeira turma de formandos no novo currículo. Tivemos a oportunidade de colher seus depoimentos e também dos professores. Das respostas coletadas, pudemos identificar diferentes posturas quanto à contribuição da disciplina de Pesquisa Aplicada à Educação, para desenvolver o objetivo de levar o aluno à autonomia de aprendizagem. Foi interessante notar que os professores que já trabalhavam  no curso antes de 1995, e que, portanto, puderam acompanhar o processo de elaboração da proposta de mudança do currículo, ressaltaram que a disciplina leva o aluno a pensar e a analisar de forma científica, afastando-o do senso comum; contribui para a autonomia cognitiva em relação ao trabalho acadêmico; faz com que o aluno perceba-se um pesquisador e, portanto, autor do seu processo de aprendizagem; que é um espaço para exercitar a possibilidade de aprender a selecionar informações e proporcionar elementos de reflexão e postura crítica; e contribui para ampliar a capacidade de leitura. Sem estas habilidades, qualquer autonomia de aprendizagem fica prejudicada, conclui um colega.

                   Ao lado destas conquistas, apontaram também que o processo está ainda em fase inicial e o aluno ainda espera receitas prontas relacionadas à prática. Há ainda o fato de vários professores não saberem como a disciplina é desenvolvida, o que indica a falta de oportunidade de um trabalho coletivo. Alguns colegas destacaram que não têm elementos suficientes para analisar a disciplina, pois pouco se fala dela no Departamento. Um deles se expressou de modo evasivo não consigo fazer esta análise, pois esta disciplina é pouco discutida no Departamento.

                   Os professores que ingressaram a partir de 1996 consideram que a disciplina é muito importante para  a formação do professor pesquisador no despertar para a busca eterna do conhecimento, na necessidade e possibilidade de sua participação efetiva na construção cotidiana desse conhecimento e contribui decisivamente para a autonomia de aprendizagem. Em contrapartida, salientam que os resultados são ainda modestos, que há alunos confusos com esta proposta em que é ele que vai planejar, traçar metas, executar, trabalhando na construção de sua autonomia. Já se distingue uma atitude diferente em relação à Disciplina e ao seu significado. A autonomia de aprendizagem está atrelada a um conjunto de fatores  institucionais  para além das disciplinas, afirma um dos professores.

Quando inquirimos os professores sobre a contribuição da disciplina que ministra, para atingir  o objetivo do curso de levar o aluno à autonomia da aprendizagem, coletamos depoimentos que demonstram a preocupação de todos os professores de levar o aluno a uma aprendizagem autônoma, a aprender a aprender e onde o processo de aquisição do saber é mais importante que o saber propriamente dito.

  uma preocupação, quase que unânime, na busca do melhor meio de levar o aluno à autonomia de aprendizagem. Entre as enumeradas destacamos: dando informações e meios para desenvolver a autonomia; valorizando sempre as tentativas experimentais como a descoberta, a pesquisa e a vivência democrática, garantindo a construção de conceitos fundamentais  para a estruturação de uma postura crítica, a busca criativa e responsável de conhecimentos e soluções; com o uso de técnicas, de textos resultantes de pesquisa teórica ou empírica. Apesar desse empenho, um colega afirma:  posso apontar, porém, que é grande a porcentagem de alunos que esperam que o professor seja responsável por sua aprendizagem. Outros apontaram que: é um processo e estamos no início, que um ano de trabalho não nos mostra resultados de um processo que é longo, e que enquanto o aluno está no curso, a autonomia não fica perceptível, que só irá se revelar quando estiver na prática. Mas, segundo um colega, já conseguimos perceber que os alunos têm tido maior seriedade no trabalho intelectual, fazendo-o com mais reflexão.

Sobre a questão que solicita a análise do professor quanto à disciplina de Pesquisa Aplicada à Educação no curso de Pedagogia, se expressaram favoravelmente à sua inclusão  no currículo, afirmando que é uma disciplina muito importante, fundamental na busca contínua de informações, na leitura-reflexão-síntese, ferramenta essencial para um educador de nosso tempo; imprescindível no currículo de Pedagogia e na formação acadêmica do aluno pedagogo; que é fundamental para a busca da autonomia em qualquer curso, na avaliação de situações pedagógicas, na definição (análise do problema) e na sistematização de soluções. É a partir dela que o  aluno conscientiza-se de que o conhecimento pode ser produzido na própria relação ensino-aprendizagem. Seu objetivo é contribuir para a autonomia do conhecimento, do trabalho acadêmico e na formação do aluno pesquisador. Para se conseguir concretizar estas propostas foram feitas as indicações: ter a pesquisa como eixo norteador do curso de Pedagogia, mas voltada à prática docente, então é necessário articular pesquisa e estágio, a prática deve ser o ponto de partida e de chegada da pesquisa e afirmam que pesquisa e estágio formam a coluna do curso. Além disso, os dados coletados devem ser objeto de trabalho das diferentes disciplinas do curso. A pesquisa deve ser o eixo central do curso, articulador das disciplinas. Ela é o diferencial do nosso curso em comparação com outras faculdades. Foi ressaltada sua importância por trabalhar em parceria com todos os componentes curriculares, daí a validade de sua distribuição nos três anos do curso.

Os alunos enfatizam que a disciplina Pesquisa Aplicada à Educação é muito importante, interessante e o ponto fundamental do curso, pois amplia o campo de visão abrindo horizontes; desperta a curiosidade propiciando oportunidade de busca quer bibliográfica como na realidade, estabelecendo um liame entre a teoria e a prática. Para alguns alunos, o tempo destinado à disciplina é pouco, não permitindo a troca de conhecimentos, nem momentos para esclarecer dúvidas, espaço para assessoria individual que é tão necessária.

Para outros alunos a disciplina Pesquisa Aplicada à Educação ainda não foi compreendida no seu significado de formação do professor pesquisador, que parece algo teórico e, assim, a disciplina fica sem sentido. Para um aluno, a disciplina tem contribuído pouco porque ele tem pouco tempo disponível. Em algumas falas, o gostar da disciplina está ligado ao gostar do professor, à empatia entre professor-aluno, o que é muito importante no processo ensino-aprendizagem.

Dois alunos de uma das turmas colocaram: é a disciplina mais difícil, pois está fora de nossas possibilidades. Esta colocação expressa como nossos jovens chegam ao curso superior, qual a sua possibilidade de reflexão e quão difícil é para eles a mudança para a conquista da autonomia da aprendizagem. Alguns alunos não sentiram a validade da disciplina e colocaram que ela não contribui em nada: é cansativa, não proveitosa, que ficam tão atarefados com a “tal” pesquisa  que não conseguem estudar outros conteúdos, que há muita exigência, e que pouco contribui para a formação, deixando-os sobrecarregados.

Outros deram testemunhos animadores:

A disciplina de pesquisa em muito serviu para que facilitasse e aprimorasse a busca de respostas;

Sensação de descobertas de um prazer maravilhoso;

Consegui comparar várias opiniões de autores diferentes sobre o mesmo tema e relacioná-los com meu ponto de vista;

Aprendi a escrever e ler analisando. Eu, que sempre gostei de ler e escrever, aprendi a escrever de forma mais científica. Consegui, graças à Pesquisa Aplicada à Educação, separar a forma literária da científica;

Deu visão de continuidade de estudos;

Faz com que conheçamos novos autores para, a partir daí, formarmos opiniões diferentes das constituídas no decorrer das aulas;

Obriga-nos a destrinchar algo não mastigado, forçando-nos, mesmo que de forma suscinta, a ampliar nossos horizontes;

Contribuindo muito, pois já que o conhecimento não é fragmentado, a partir de leituras e observações é possível, pelo menos, tentar relacionar os dados;

                   Estas colocações apontam muito dos objetivos propostos pela disciplina Pesquisa Aplicada à Educação.

 

IV – Nossas perspectivas e prospectivas

 

                        Em nosso Projeto Pedagógico para o Curso de Pedagogia pensamos na formação do professor inquieto com a realidade e autônomo no desempenho do seu trabalho; que tenha claro os seus valores e os da cidadania; capaz de interagir com seus pares  e, muito intensamente, com seus alunos, e que seja um professor pesquisador.

                   Para conseguirmos efetivar esta proposta traçamos o perfil do professor do Curso de Pedagogia: que pense coletivamente, que sua crítica seja profunda e transparente, que as relações sejam pautadas por procedimentos éticos, que busque permanentemente a sua qualificação, que desenvolva pesquisa, que reavalie constantemente sua prática e que sempre considere que está ali formando futuros professores.

                   Nestes três anos e meio conseguimos um grande avanço. Muitas das nossas expectativas tornaram-se realidade e outras têm nos desafiado na busca incessante de alcançá-las. Atualmente, já podemos assegurar que a disciplina de Pesquisa Aplicada à Educação tem hoje uma proposta mais clara para os três anos do curso, mas não conclusiva. Seu entrosamento com o Estágio Supervisionado está previsto de tal modo que o aluno busca, na prática, dados da realidade que irão subsidiar o seu projeto de pesquisa, ao mesmo tempo que a proposta de pesquisa direciona o seu estágio. Para além desta conquista, os alunos já conseguiram envolver os professores que trabalham na área do seu tema de pesquisa provocando, assim, o entrosamento com as demais disciplinas do curso. Certamente, que a busca na realidade através do estágio, junto aos professores, ou bibliográfica, leva o aluno a relacionar teoria e prática.  Dá sentido ao estágio enquanto constrói o projeto de sua pesquisa e promove a interdisciplinariedade.

                   Da pesquisa junto aos professores pudemos concluir que os professores consideram importante as propostas de mudança, principalmente em relação à inclusão da disciplina Pesquisa Aplicada à Educação no Curso de Pedagogia. Ela é o eixo que promove a interdisciplinariedade e que é básica para a formação do professor pesquisador e na formação acadêmica. Também enfatizam que este processo de mudança do nosso curso está em construção e que é necessário discuti-lo mais nas reuniões do Departamento de Pedagogia.

                   Os alunos também ressaltaram a importância da disciplina Pesquisa Aplicada à Educação para sua formação profissional, mas tanto para ela quanto para o Estágio deram as pontuações mais baixas na pesquisa que realizamos. Levantaram dificuldades mais ligadas à didática e demonstraram sua insegurança com relação à nova proposta dizendo que a disciplina é muito difícil pois está fora de nossas possibilidades. Em contrapartida, outro aluno mostra o quanto a disciplina o ajudou a desenvolver o seu gosto por pesquisar e escrever de forma mais científica e conclui: Claro que ainda não estou cem por cento, mas chego lá.

                   Inferimos que a atenção a ser dada a ela deve ser objeto de nossas discussões para que possamos ajustá-la melhor aos objetivos da proposta. Devemos também considerar que os alunos se depararam com algo diferente do que vinham tendo na sua escolaridade. Isto demanda um esforço maior, quer dos alunos como dos professores, para que se consiga provocar a mudança esperada.

                   Parafraseando o último aluno acima citado, posso dizer que também estamos construindo o nosso caminho na busca constante do aprimoramento do Curso de Pedagogia do UNISAL, ou seja, “chegar lá”, mesmo que este “lá”, na verdade, se afaste toda vez que dele nos aproximamos, pois o aperfeiçoamento constante é uma trilha infinita, como tem sido a formação humana.

                   Neste momento em que se discute o destino do Curso de Pedagogia nossa perspectiva atual é a de propiciar a formação de um pedagogo que:

• seja capaz de desenvolver o trabalho coletivo sem descuidar do aprimoramento de seu trabalho individual, pois estas duas instâncias estão encadeadas;

• seja um questionador, um pesquisador sensível aos problemas da educação e autônomo no seu trabalho;

• consiga atingir as posturas de aprender a aprender; aprender a fazer e aprender a ser.

Com um olhar mais distante no tempo podemos vislumbrar um curso de Pedagogia que consiga:

• um currículo onde as disciplinas não tenham mais seus campos delimitados mas que trate dos problemas educacionais à luz do conhecimento como um todo;

• que a pesquisa seja o eixo que desencadeie este currículo;

• que a reflexão seja um ato contínuo na ação de alunos e professores;

• que forme o professor-cidadão, capaz de interferir no contexto social e político do lugar em que vive.

                   Minha esperança é de que esta dissertação gere uma vontade de continuidade do trabalho que, iniciado no começo dos anos 90, atravessou a década e adentra o novo milênio sempre aberto a novas contribuições, em um processo de transformação e aperfeiçoamento contínuo.

 

 

 

 

 

 

       Notas

 

 


       1 BOSCO, Dom Bosco, Uma Bibliografia Nova, pág. 264

       2 Ibdem, pág. 284

       3 LOURENÇO FILHO, Introdução ao Estudo da Escola Nova, pág. 155

 

 

 

 

 

 

V – Bibliografia

 

       A OBRA  Salesiana  no  Brasil  no  seu cincoentenário:  1883-1933.  (s.d.).  São Paulo:

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