EDUCAÇÃO E NACIONAL-DESENVOLVIMENTISMO NO BRASIL
Manoel Nelito M. Nascimento[1]
Em maio de 1945, a 2ª Guerra Mundial chegava ao fim com
a vitória das Forças Aliadas, lideradas pelos Estados
Unidos, sobre as forças nazi-fascistas. Este acontecimento
repercutiu na política brasileira, a ponto de acelerar
o fim do regime ditatorial do Estado Novo (1937-1945), com a
deposição de Vargas, dando início a uma
nova fase de redemocratização do país.
A aliança vitoriosa das superpotências EUA e URSS
contra o nazi-fascismo, logo após o fim do conflito, deu
lugar à chamada “Guerra Fria”, que opunha
as forças ocidentais capitalistas lideradas pelos EUA
e as forças orientais socialistas lideradas pela URSS.
Como importante país da América Latina, a política
brasileira esteve sob pressão da “Guerra Fria”,
resultando na colocação do partido comunista na
clandestinidade e na perda de mandato dos deputados eleitos pelo
partido. No que diz respeito à educação,
na obra A educação negada, Buffa e Nosella (1991)
observam que
... não poderia o debate educacional deste período,
centrado na elaboração da Lei de Diretrizes e Base,
ficar imune. Embora persistindo a apologia à democracia
e à liberdade, seus limites e contornos eram dados pelo
anticomunismo.
Desde o Estado Novo, a política brasileira se caracterizava
pelo populismo, nacionalismo e desenvolvimentismo. O populismo
era adotado como instrumento de controle e mobilização
das massas em proveito das classes dominantes. O nacionalismo
surgiu entre os grupos políticos, tecnocratas e militares,
que buscavam uma estratégia estatal capaz de enfrentar
os problemas do desenvolvimento crônico do Brasil. (Cunha,
1989).
A ideologia do nacional-desenvolvimentismo teve como lócus
privilegiado de discussão e desenvolvimento o Instituto
Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, que foi criado
em 1955, no governo interino de Café Filho. No governo
de Juscelino Kubitschek o ISEB passou a ser peça essencial
da nova administração, com a atribuição
de formar uma mentalidade nacional para o desenvolvimento.
No pós-segunda guerra mundial, a reconstrução
dos países diretamente envolvidos no conflito, gerou uma
fase de crescimento da economia mundial, a denominada “era
de ouro”, na qual deu-se o estabelecimento do “Estado
do Bem Estar Social” nos países centrais. Após
a fase de reconstrução, ocorreu um período
de ampla internacionalização do capital.
O avanço do capitalismo para os paises periféricos
encontrou o Brasil numa forma peculiar de desenvolvimento, onde
a entrada de capitais externos era discutida como opção
para acelerar o seu desenvolvimento. Havia o consenso entre os
grupos sociais na defesa da industrialização como
forma de desenvolver o país. No entanto, a burguesia brasileira
estava dividida entre os que defendiam a industrialização
sob o controle total do capital nacional e os partidários
da participação e comando do processo de industrialização
brasileira dos capitais estrangeiros.
Entre o suicídio de Vargas em 1954 e a posse de JK, no
governo de Café Filho, foi baixada a Portaria 113 da SUMOC – Superintendência
da Moeda e do Crédito, que concedia vantagens ao capital
estrangeiro que investisse no país. No governo JK, esta
portaria foi aproveitada para atrair o capital externo e acelerar
o processo de produção de equipamentos, bens de
consumo duráveis e produtos químicos. No final
da década de 1950, o parque industrial brasileiro havia
crescido e diversificado, consolidando a indústria de
base no país.
Os governos neste período, em especial os de JK e Jango,
tentaram conciliar o modelo político nacional-desenvolvimentista
com o modelo econômico de substituição das
importações em sua segunda fase, com a participação
do capital estrangeiro.
Após a II Guerra Mundial, a área rural no Brasil
foi invadida pelo capital promovendo a modernização
da produção. Ambos os fenômenos, a industrialização
do país e a modernização da produção
rural (capitalismo no campo), contribuíram para intensificar
a migração da população rural para
os centros urbanos, de tal forma, que a população
urbana do país ultrapassou a rural em número na
década de 1960.
No início da década de 1960 a sociedade brasileira
já havia se tornado bastante complexa, resultado do desenvolvimento
urbano e industrial e da mudança das relações
de trabalho no campo. Havia um alto nível de desigualdades
sociais, que motivaram os movimentos de luta por reformas de
base que reduzissem as grandes diferenças de condições
de vida entre as classes sociais.
O governo Goulart, ao tentar compatibilizar a manutenção
do modelo político nacional-desenvolvimentista e mudar
a orientação econômica através das
reformas de base, sob o argumento de, com esta ação,
provocar a redução das desigualdades sociais, deu
origem à uma nova crise econômica e social, que
levou ao golpe militar de 1964 (RIBEIRO, 2003, p. 155).
É esse contexto de redemocratização do país, com
uma política baseada no populismo e nacionalismo, e no plano econômico
pela opção ao desenvolvimento econômico nacional associado
ao capital externo e da crescente urbanização das capitais de
Estado, que explica as linhas gerais da educação nesse período
e que foi marcada, principalmente, pela elaboração da lei de
diretrizes e bases da educação nacional.
A quarta Constituição da República foi promulgada
em 1946, inspirada na ideologia liberal-democrática. A
União, com a atribuição que recebeu de “fixar
as diretrizes e bases da educação nacional”,
encaminhou uma proposta de LDB ao Congresso, que teve um período
de treze anos de tramitação, com acaloradas discussões
entre os educadores progressistas defensores da escola pública
e os conservadores que eram partidários da defesa de privilégios à escola
privada.
Estas discussões retomaram o debate iniciado na década
de 1920, tornando um dos períodos mais fecundos da luta
ideológica em torno dos problemas da educação,
cujos aspectos ideológicos em disputa eram os mesmos de
antes: a investida das lideranças conservadoras contra
a ação do Estado na promoção da educação
pública para a população (ROMANELLI, 1998).
Outra questão colocada em discussão tratava da
centralização, que preocupava os progressistas,
diante da política centralizadora do Estado Novo. A discussão
sobre a centralização ou descentralização
colocava em pauta a questão sobre qual o modelo mais eficiente
para ampliar as oportunidades educacionais, estando os educadores
progressistas contrários à tendência centralizadora
do Estado. (Ribeiro, 2003, p. 146).
Os conservadores, representados pela Igreja Católica,
manifestavam suas preocupações com a questão
da laicidade do ensino. Apesar da separação da
Igreja e Estado a partir da Proclamação da República,
a Igreja continuou atuando sobre a vida nacional, através
da educação. A superioridade em número de
colégios católicos, em especial para as elites,
bem como a tradição católica da população
brasileira, permitiam que a Igreja tivesse uma ampla atuação
sobre a sociedade.
Além dos interesses puramente comerciais em jogo, que
afetavam igualmente os dois setores envolvidos nessas correntes,
ou seja, o leigo e o católico, existia ainda, por parte
deste último, o interesse de ordem doutrinária,
vale dizer, ideológico. Urgia aproveitar a oportunidade
para, através da cobertura dada “pelos direitos
da família”, recuperar a influência antes
exercida em todos o sistema educacional e – por que não? – na
vida mesma da Nação. Para tanto, a Igreja contava
com a tradição católica da sociedade brasileira.
(ROMANELLI, 1993, p. 171).
Nessa direção, em 1959, os educadores progressistas
e o Jornal “O Estado de S.Paulo” desencadearam a
Campanha de Defesa da Escola Pública, no interior do qual
foi divulgado o “Manifesto dos Educadores Mais uma vez
Convocados”, invocando e “requentando” as idéias
do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova” de
1932.
A LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional - foi aprovada através da Lei 4024, em 1961.
Como principais características desta lei, pode-se destacar:
a garantia de igualdade de tratamento por parte do Poder Público
para os estabelecimentos oficiais e particulares; a obrigatoriedade
do ensino primário, conquistada na Legislação
anterior, foi prejudicada pelas isenções que a
Lei permitia e que, na prática, anulava a sua obrigatoriedade;
a estrutura de ensino não foi alterada: continuava o ensino
pré-primário, o ensino primário de 4 anos,
o ensino médio, nas modalidades: ginasial em 4 anos e
colegial em 3 anos, e o ensino superior; o Conselho Federal de
Educação recebeu a delegação de determinar
os valores das bolsas de estudo e financiamento para os graus
de ensino, que a lei atribuia aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Territórios. Pode-se destacar, também, como
aspectos positivos da LDBEN: a unificação do sistema
escolar e a sua descentralização; a autonomia do
Estado para exercer a função educadora e o da distribuição
de recursos para a educação.
Em relação às concepções pedagógicas
defendidas no período nacional-desenvolvimentista, Saviani
(2005) assinala:
[...] se o período situado entre 1930 e 1945 pode ser
considerado como marcado pelo equilíbrio entre as influências
das concepções humanista tradicional (representada
pelos católicos) e humanista moderna (representada pelos
pioneiros da educação nova), a partir de 1945 já se
delineia como nitidamente predominante a concepção
humanista moderna.
A ênfase no desenvolvimento econômico do país,
como pressuposto para o desenvolvimento das demais instâncias
da sociedade, produziu uma inversão do papel do ensino
público, colocando a escola sob os desígnios do
mercado de trabalho, passando a concepção produtivista
a moldar todo o ensino brasileiro por meio da pedagogia tecnicista.
(Saviani, 2005)
Enquanto o desenvolvimento caminhava fundamentalmente no sentido
da expansão do capitalismo industrial no Brasil, a educação
escolar continuava a estruturar-se em bases, valores e técnicas
próximas da mentalidade pré-capitalista.
A LDBEN frustrou as expectativas dos grupos mais progressistas,
que esperavam um avanço na legislação educacional,
no sentido de ampliar o atendimento das necessidades das classes
populares.
A decepção dos grupos progressistas que lutaram
pela educação pública e desempenharam um
papel importante na solução dos problemas nacionais,
os levou a se lançarem nas campanhas da educação
popular. Os movimentos mais significativos foram o Movimento
de Educação de Base (MEB) e o Movimento Paulo Freire
de Educação de Adultos.
A opção pelas reformas de base - agrária
e urbana - com o objetivo de reduzir as desigualdades sociais,
acabou agregando os setores mais conservadores da sociedade até a
deposição de João Goulart pelo golpe militar
de 1964 e a perseguição aos movimentos populares
e de estudantes até serem extintos.
Referências Bibliográficas:
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na Era Vargas e no Nacional-Desenvolvimentismo (1930 - 1964).
Texto inédito, 2006
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Brasil após 30. In: HOLANDA, S. B. (Dir.) O Brasil Republicano:
economia e cultura. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1995. vol.
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BUFFA, Ester. Ideologias em conflito: Escola pública e
Escola privada. São Paulo: Cortez & Moraes, 1979.
BUFFA, Ester; NOSELLA, Paolo. A educação negada.
São Paulo: Cortez, 1997.
CUNHA, Luiz Antônio. A universidade crítica. 2ª ed.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Ideologia e educação
brasileira – católicos e liberais. São Paulo:
Cortez, 1988.
GHIRALDELLI JR. Paulo. História da Educação.
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IANNI, Octavio. __________. Estado e planejamento econômico
no Brasil. 5ª ed. Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1991.
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de Janeiro: Civilização Brasileira, 1988.
RIBEIRO, Maria Luisa Santos. Introdução da História
da Educação Brasileira> a organização
escolar. 18ª ed. São Paulo: Autores Associados, 2003.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação
no Brasil. 21ª ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
SAVIANI, Dermeval. As Concepções pedagógicas
na História da Educação Brasileira. Apresentado
na sessão de Comunicações em História
da Educação do HISTEDBR, na Faculdade de Educação – UNICAMP,
em 25/agosto/2005.
SAVIANI, Dermeval. Educação brasileira: estrutura
e sistema. São Paulo: Editora Saraiva, 1973.
[1] Mestre em
Educação pela PUC-Campinas. Doutorando de Filosofia
e História da Educação na UNICAMP.
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